Esse artigo busca jogar luz nas manifestações efêmeras de grafite, realçando seus significados, abrindo espaço para o discurso urbano, através de escritos em diversas superfícies da cidade. A partir do hábito de errâncias na cidade, começo a perceber uma intensificação de certas manifestações textuais, ainda que de diversas naturezas, as quais inicialmente não se encaixavam no conceito tradicional do grafite. Partindo da necessidade de olhar mais detalhadamente para o que está acontecendo na cidade do Rio de Janeiro, percebi que havia uma outra linguagem de grafite, e que este precisava de uma definição que desse conta de suas especificidades. Foi quando emergiu o seguinte pensamento: se a cidade é um livro aberto, os grafites textuais podem ter significados literários. Daí surgiu o nome “Grafite Literário” (GL). Os GLs são manifestações que emergem de forma poética e política, inseridos no sistema da arte e a(r)tivismo próprio da cidade contemporânea. Assim, ao longo desse artigo, vou utilizar a sigla GL para me referir aos textos inscritos nos muros da cidade, com mensagens de diversas naturezas, sejam políticas, literárias ou poéticas, produzidos com várias técnicas, tais como xilogravura, impressão digital, xerox, tinta spray, estêncil.
Cabe lembrar que, na história, o hábito de grafitar data do período pré-histórico, como é o caso das pinturas rupestres, encontradas nas paredes e tetos das cavernas, verdadeiras representações artísticas que simbolizavam um modo de vida da época.
No século XX, a prática de grafitar muros e paredes com inscrições de teor poético ou político ganham força em maio de 1968, na cidade de Paris, com os movimentos da contracultura. Naquele ambiente, jovens descrentes com o rumo do capitalismo e usando tinta spray rasgam o verbo para falar e expressar nos muros da cidade sua insatisfação. Essa prática percorre o mundo e, como não poderia deixar de ser, o artista acompanha e age nesse processo. Jean-Michel Basquiat, em Nova York, é um exemplo (Figura 1). Seus grafites têm uma forte contestação política, representado o que acontecia mundialmente naquele momento histórico.
Os grafites se expandem e se tornam presença marcante no cenário cultural no mundo inteiro. Eles ocupam o epicentro da arte urbana, utilizando técnicas de pinturas sofisticadas, aplicadas em tamanhos gigantescos nas grandes empenas dos prédios, muros e outras superfícies pela cidade. Ao longo desse processo, o grafite ganha reconhecimento no campo da arte e participa como elemento cultural nas reestruturações urbanas, ou nas chamadas requalificações urbanísticas nas cidades pelo mundo todo. No Rio de Janeiro não foi diferente, onde podemos ver, no Porto Maravilha, na região portuária, o trabalho produzido pelo muralista Eduardo Kobra (Figura 2), que mostra uma imagem figurativa com vários elementos da nossa cultura, marcando presença num ambiente recém-restaurado.
A partir dessas premissas, mas na contramão dessas experiências urbanas, encontramos também uma outra linguagem nos muros e paredes da cidade, que pulveriza um discurso importante para ser apreendido e ouvido, e que, como já delineei acima, são textos e/ou mensagens difundidas pelos GLs. Buscando realçar a importância desse discurso urbano, é importante observar que os GLs não estão inseridos numa agenda urbana de culturalização, portanto não se encontram nas soluções das ditas “cidades criativas” (Seldin, 2015, p. 54). Eles são manifestações espontâneas, que surgem da produção feita por artistas, mas também por outros profissionais, que utilizam o espaço da cidade para expor e apresentar seu trabalho, pensamento e/ou questionamentos que marcam a vida do citadino.
Os GLs ainda guardam uma rebeldia e irreverência que se situam no contexto performático de ações efêmeras e rápidas, frente aos impedimentos legais de uso dos muros ou paredes da cidade. Os GLs têm em sua natureza artística, mesmo que informalmente, uma base literária, que se aproxima de pensamentos poéticos, de manifestação política e/ou de posicionamento nos enfrentamentos sociais, em contraposição aos interesses neoliberais que nosso país vem enfrentando nos últimos tempos.
Um exemplo importante na história da cidade do Rio de Janeiro é o Profeta Gentileza (Figura 3), que, nas suas errâncias, ganhou destaque, transformando uma série de muros cinza a céu aberto em poesia, com frases e mensagens de amortização que são ícones da cidade – “Gentileza Gera Gentileza”. Sua ação artística influenciou a vida e o cotidiano dos citadinos nos anos 1980, fazendo circular pelo espaço urbano um discurso repleto de significações, sentidos, memória, numa fala heterogênea e simbólica. Gentileza escreveu o conhecido “Livro Urbano”,[1] que são mensagens grafadas ao longo das 56 pilastras do viaduto do Caju, na zona portuária do Rio de Janeiro, participando ativamente em um momento importante de abertura política no país (Yado, 2016, p. 19).
Há vagas
Tomemos como outro exemplo o GL lambe-lambe[2] (Figura 4) de autoria do artista Marcelo Oliveira, cujo título do trabalho é “Há vagas”. O conteúdo do GL descreve a imagem de uma mulher negra, numa posição que faz referência a um tipo de escultura popular muito comum de ser encontrada no interior de Minas Gerais, conhecida como “Namoradeira na janela”, complementado pelo seguinte texto: “Precisa-se / Procura-se – uma moça confiável e sem vícios, que trabalhe fora para morar em casa de família.”
Assumindo esse GL como uma ação de “Arte A(r)tivismo” no contexto do espaço urbano, ele traz à cena a procura por moça “negra”, sem vícios para morar em casa de família, na mesma linguagem dos anúncios de jornal de compra e venda de escravos no séc. XIX. O anúncio (Figura 5) é um exemplo que põe em destaque “precisa-se comprar uma escrava sem vícios e que saiba cozinhar” – sem vícios era uma exigência muito comum entre os senhores de escravos na época.
Diante do exposto, percebe-se uma preocupação com a questão da escravidão e do racismo ainda presente nos dias atuais. Os dados não mentem. No Brasil, em 2017, 75,5% das vítimas de homicídios foram indivíduos negros, cerca de 43 negros a cada 100 mil habitantes, ao passo que a taxa de não negros é de 16 a cada 100 mil habitantes (IPEA, 2019). Passados quase dois séculos da abolição, nossa sociedade ainda não superou o trauma da escravidão. Marcelo está atento e, por meio do seu trabalho, dá voz a uma imensa população excluída e marginalizada quando diz em entrevista a esta pesquisadora o seguinte:
Existe um inconformismo no ar, um desejo por mudanças que não são atendidos pelas vias legais. Então, vejo que essas intervenções buscam as frestas, as brechas, resta-nos assim a desobediência civil. O sentimento de urgência, o grito contido nos impele a agir. Temos muito a dizer.[3]
Colocadas essas questões, aqui podemos distinguir dois campos epistemológicos a serem analisados: um refere-se à ação artística aplicada no espaço urbano, portanto no contexto da cidade, e o outro aos aspectos políticos e sociais que demarcam esse tipo de manifestação dita como “Arte A(r)tivismo”. A cidade na contemporaneidade se tornou o lugar de manifestações artísticas, assumindo propriedades intrínsecas da própria obra, evocando a mediação do discurso como parte do processo criativo, conforme afirma Cocchiarale, e se deparando com uma autonomia da arte, cuja produção se expande para os espaços urbanos, atuando no campo estético, mas também no campo ético-político (Cocchiarale, 2007, p.184, 187).
No campo estético, esse GL tem uma característica de ter sido produzido em xilogravura, impresso em papel, uma técnica tradicional, que utiliza como suporte a madeira, mas, nesta imagem, o artista se apropria também de tinta guache e fita adesiva como recursos para a composição. O resultado visual é bem diferente dos grafites produzidos com tinta spray, dando uma qualidade e refinamento ao trabalho. Vale destacar que normalmente esses GLs são fixados em vários lugares da cidade e em grandes áreas de circulação, com o objetivo de levar a mensagem a um maior público.
Sob esse olhar, percebemos uma relação íntima entre arte e cidade que tem emergido no campo do urbanismo como um amplo recurso para análises e estudos do ambiente urbano. É interessante observar que, nesse campo, são várias as reflexões. Nelson Brissac Peixoto afirma que a arte, assim como a filosofia, é modo de habitar a cidade, e nesse sentido a arte não existe na cidade, ela é a cidade, enquanto a cidade reflete a si mesma – ela apresenta o estado do tráfego de interesses, paixões, pensamentos, tudo aquilo que envolve nossa experiência urbana (Peixoto, 2006, p. 488).
Essa experiência urbana, no caso do GL, é uma manifestação que marca uma forma de agir, em que o artista, por meio de suas práticas, enfatiza as relações sociais, tornando-se um mediador social, ativando, mesmo que temporariamente, o convívio, em alguns casos como um etnógrafo de microestratégias de territorialização, em outros interferindo em pequenas táticas no habitat, evocando situações rápidas e perturbadoras, pequenos ruídos na entropia urbana (Florido, 2011).
Inserido numa multiplicidade de sensações e percepções da vida, do mundo e de sua própria condição humana, o artista aberto para o processo de criação passa por muitos estágios e experiências, que demandam uma capacidade de se inserir numa dinâmica de interação constante consigo mesmo e com o público. Acompanhando todo o processo histórico das cidades e os percursos da arte, o artista, frente às constantes demandas e desejos, vai percorrer caminhos de camadas complexas, às vezes sozinho ou em grupos, coletivamente. Desde os anos 1980, uma série de mudanças redesenham o circuito da arte em decorrência das novas pressões da economia neoliberal e da ordem mundial global, com reflexos também no Brasil (Basbaum, 2013, p. 22).
Esta é uma situação que exige do artista uma produção de arte que requer operar com vetores de um campo ampliado, que abre ao entrecruzamento das diversas áreas do conhecimento, num panorama transdisciplinar, sem prejuízo de sua autonomia e especificidade enquanto prática da visualidade. Segundo Ricardo Basbaum, o artista se move num território de paisagem não natural, com ações precisas, ao mobilizar instabilidades do campo cultural, lugar que permite problematizações, conflitos, paradoxos, por meio de uma inteligência plástica e de uma rede de relações entre muitos pontos de oposição (Basbaum, 2013, p. 27).
Vista por esses processos, no entrelaçamento dessas questões e na produção do trabalho artístico, emana uma emergência na visualização, na busca de olhar os GLs num campo ampliado e sob um contexto, segundo o teórico da cultura visual Nicholas Mirzoeff, que abre espaço para o despertar do “direito ao olhar”. Um direito, porém, não meramente como uma questão de visão, mas como uma ação que no nível pessoal começa adentrando os olhos de alguém para expressar amizade, solidariedade, ou amor de forma mútua, cada um inventando o outro, caso contrário ele falha. O direito a olhar reivindica autonomia, não individualismo ou voyeurismo, mas pleiteia uma subjetividade e coletividade políticas (Mirzoeff, 2016, p. 746).
Encontro poesia lendo suas linhas
Trazendo para o universo poético literário (Figura 6), a cidade do Rio Janeiro recebeu uma série de GLs do poeta Jaime Filho,[4] produzidos em impressão digital sobre papel colorido, cuja mensagem tem uma linguagem de amorização, fruto da sua vontade de levar poesia para a cidade, como ele mesmo diz em entrevista a essa pesquisadora:
Investigando os poemas desses GLs, percebemos como a cidade, a rua, de fato é um grande livro aberto, lugar de discurso, aberto para o devir. Henri Lefebvre afirma que a rua é o lugar (topia) do encontro, sem o qual não existem outros encontros possíveis nos lugares determinados (cafés, teatros, salas diversas). Ele percebe a rua como um teatro espontâneo, se vê como espetáculo, espectador e às vezes como ator, e diz que nela efetua-se o movimento e a mistura sem os quais não há vida urbana, mas segregação estipulada e imobilizada. Ele ainda argumenta que a rua é um lugar da palavra, lugar de trocas das palavras e signos, e ainda diz que a palavra pode tornar-se selvagem e inscrever-se nos muros, escapando das prescrições e instituições (Lefebvre, 2002, p. 29-30).
A poesia do Jaime Filho reflete esse escapamento das instituições. Nesse sentido, podemos perceber que, no poema “encontro poesia lendo suas linhas”, que nos lembra um haicai, curto e numa linguagem direta e simples, ele abre espaço para pensar o corpo do outro (aqui esse corpo não é necessariamente o corpo materializado, mas pode ser o corpo subjetivo), não como posse, mas como direito a olhar subjetivamente, inspirando um modo de viver coletivamente na cidade. O poema “saudade é tatuagem na pele da alma”, colocado propositalmente ao lado do mosaico de azulejo, em homenagem a Marielle Franco, ecoa a potência de que ela jamais será esquecida. A pele da nossa alma está impregnada do horror que foi o assassinato dela, tal qual as tatuagens que os judeus tiveram sem seus corpos, marcados como gado na Alemanha durante a Segunda Guerra Mundial. É impossível esquecer tamanhas violências. Já o poema “Paz Amor Poema e Jujuba” traz um frescor ao coração, uma imagem delicada de se estar com o outro, uma potência de alegria e doçura. Sempre que encontro esse poema no centro da cidade, começo a sorrir. É um instante em que outras preocupações se apagam, e o gosto da jujuba emerge, lembrando sempre da minha infância.
Nos parece, então, que a rua evidencia esse lugar de troca com o outro, é o espaço de experiência urbana de alteridade, que questiona a pacificação do espaço público produzida por falsos consensos esterilizantes de consumismos, ou de atravessamento do tempo pela aceleração do trânsito e das pessoas nas suas buscas quase infinitas de um sonho.
Segundo Franklin Leopoldo e Silva, nossa sociedade é marcada pelo narcisismo, em que existe uma separação profunda, um abismo, entre o eu e o outro, características éticas muito comprometedoras da nossa civilização, e isso reforça preconceitos de toda natureza (Silva, 2017). Ele ainda enfatiza, inspirado em Emmanuel Lévinas, a necessidade de uma ética da alteridade e faz as seguintes perguntas:
Como seria uma ética em que o princípio da moralidade fosse o outro e não o eu, em que ele me constituísse como realidade ética e não eu a ele? Como seria o mundo em que eu dependesse do outro, e não o outro de mim? (Silva, 2017).
Franklin responde que existem vários aspectos em que isso é colocado na nossa contemporaneidade, e um deles é a ecologia. Com a ecologia, existe uma tentativa de fazer com que o eu veja o mundo a partir do outro, ou seja, pergunta ele novamente: como será o mundo daqui a duzentos anos se continuarmos a explorá-lo dessa forma? Haverá mundo para os outros? Se não houver mundo para eles será que eu não sou responsável por essa catástrofe? A partir daí, não seria o caso de adquirir certa consciência ecológica para preservar o mundo para os outros? Nestse sentido, o que está em pauta no aspecto ecológico é valorizar o outro mais que a mim mesmo e viver mais em relação ao outro, ou pelo menos tentar um equilíbrio (Silva, 2017).
Sob essas perspectivas, os poemas do Jaime Filho são um esforço de ecologia, que percorrem tanto o caminho ilustrado por Lefebvre, no uso do espaço urbano, como as questões de alteridade colocadas por Franklin Leopoldo e Silva, contra todas as dificuldades de um poeta motoboy, que luta nas entranhas das ruas, rasga o verbo nas paredes e muros da cidade. Ele se envolve e envolve o outro nesse discurso, aproximando-se de si e do outro, não como apropriação, mas na liberdade da passagem efêmera de um errante.
A cidade como Epifania Literária[5]
A cidade pós-industrial é onde se aplica com mais propriedade aquilo que entendemos como espaço urbano, cujo conceito está intrinsecamente ligado à sua relação com a sociedade. Nesse sentido, a concepção do espaço como produto social, não como objeto, mas como um conjunto de relações – ou seja, não concebido como passivo ou vazio –, pois o espaço em sua interação social intervém na própria produção, organizando o trabalho produtivo, os fluxos de matérias primas e de energias, numa grande rede de distribuição (Lefebvre, 2000, p. 7).
Hoje vivemos num mundo veloz e de fluidez constante, aparecendo no imaginário e na ideologia como se fosse um bem comum, uma fluidez para todos, no dizer de Milton Santos (2010, p. 83). Tudo gira em torno de uma competitividade, com fortes embates entre os diversos atores, sustentada numa globalização baseada proeminentemente nas técnicas de informação. O papel das finanças ganha destaque na reestruturação dos espaços geográficos, forçando uma compartimentação, que se choca com o movimento geral da sociedade, produzindo “uma verdadeira esquizofrenia”, em que os lugares escolhidos beneficiam vetores da racionalidade dominante (Santos, 2010, p. 80).
A cidade moldada nesses procedimentos globalizantes, em especial a cidade do Rio de Janeiro, emerge de conflitos e tensões, frente a produção simbólica da cidade a serviço dos megaeventos (Copa do Mundo e Olimpíadas), que impulsionam espaços gentrificados e disneyficados, que escondem e homogeneízam os gostos, com consequências na apropriação do espaço público e na formação da cidadania (Sánchez e Guterman, 2016, p. 220).
Talvez seja uma ousadia qualificar a cidade como uma epifania libertária, mas postos essas transformações e os desafios sociais impregnados de discursos, a exemplo do livro urbano do Profeta Gentileza e dos GLs aqui apresentados, nos parece adequado, na perspectiva apresentada neste artigo, incide sobre o espaço urbano uma qualidade literária, nas diversas camadas que moldam a vida na cidade.
A palavra epifania tem sua origem etimológica no grego epiphainein, “manifestar”; raiz em phainein, “mostrar, fazer aparecer”.[6] Nesse sentido, pode-se entender a cidade como lugar de manifestação literária, abrindo espaço para tornar legível ao outro a escrita reservada somente aos livros e/ou às mídias eletrônicas. Os GLs aqui apresentados são poemas que deixam de ocupar um lugar de objeto e se transformam em experiências, práticas, ações, refugiadas em territórios absolutamente refratários, viralizadas nos espaços da cidade, inseridas na arte da guerrilha urbana, infiltradas em territórios diversos, descoladas de uma apresentação tradicional dos livros, das livrarias, ocupando o espaço do simbólico (Penna, 2017).
Trazendo a reflexão de João Camillo Penna, de que não existe uma essência da poesia, que ela não precisa ser reconhecível para ser poesia, e que nem precisa assemelhar-se a traços que reconhecemos como poesia (Penna, 2017), podemos entender que a poesia atravessa diversas narrativas. Inspirado no pensamento de Christophe Hanna (2003, p. 9), Penna afirma que, na poesia contemporânea, o poema não significa, não tem sentido, nem um valor estético acima de tudo; ele visa a um impacto político, com a intenção de agir de forma direta sobre a sociedade.
Se a poesia contemporânea tem a possibilidade de agir diretamente sobre o social, ela cumpre o papel de ativar pensamentos, podendo alterar nossa percepção da realidade e como nos relacionamos com as pessoas e com a vida. Então, ela passa a ser um instrumento de revelação, ainda que efêmero, prolongando a atenção e seu significado ao leitor. Ao sorrir para um poema na cidade, ativamos outros estados de ser. Assim, podemos afirmar que os GLs são um esforço de posicionamento do artista frente a esse sistema global complexo, na tentativa de encontrar um lugar de afeto na cidade, que emerge desse “artista poeta” numa constante reflexão, ativando constantemente percepções outras do sensível.
* Ana Prado é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em História das Ciências e das Técnicas e Epistemologia/HCTE/UFRJ. Formada em arquitetura e urbanismo, com experiência em projetos de urbanização de favelas, e artista visual com atuação em gravura, fotografia e pintura, com várias exposições no Brasil e exterior.
Referências
BASBAUM, Ricardo. Manual do artista – etc. Rio de Janeiro: Azougue Editorial, 2013.
COCCHIARALE, Fernando. O espaço da arte contemporânea. In: PESSOA, Fernando; CANTON, Katia (org.). Sentidos na/da arte contemporânea: seminários internacionais. Rio de Janeiro: Museu Vale do Rio Doce, 2007, p. 180-189.
HANNA, Christophe. Poésie Action Directe. Paris: Romainville/Calaméo, 2003.
LEFEBVRE, Henri. A revolução urbana. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2002.
PEIXOTO, Nelson Brissac. Arte & Cidade. In: FERREIRA, Gloria. Crítica da arte no Brasil: temáticas contemporâneas. Rio de Janeiro: Ed. Funarte, 2006.
SÁNCHEZ, Fernanda; GUTERMAN, Bruna. Disputas simbólicas na cidade maravilhosa: atores, instrumentos e gramática territorial. In: VAINER, Carlos; BROUDEHOUX, Anne Marie; SÁNCHEZ, Fernanda; OLIVEIRA, Fabricio Leal de (org.). Os megaeventos e a cidade: perspectivas críticas. Rio de Janeiro: Letra Capital, 2016.
SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. Rio de Janeiro: Record, 2010.
SELDIN, Claudia. Da capital de cultura à cidade criativa: resistências a paradigmas urbanos sob a inspiração de Berlim. Tese (Doutorado em Urbanismo). Programa de Pós-Graduação em Urbanismo da Faculdade da Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2015.
YADO, Thaís Harumi Manfré. Sentidos no espaço urbano: os dizeres de Gentileza dentro e fora da cidade. Tese apresentada ao Centro de Educação e Ciências Humanas da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), 2016.
Documentos eletrônicos
FLORIDO, Marisa. Transformações na prática artística: entre a rua e o ateliê: o artista e a cidade. Curso livre de História da Arte, Pinacoteca do Estado, vídeo parte1, julho de 2011. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=f1SpEwnSD5k>. Acesso em: 21/11/2019.
MIRZOEFF, Nicholas. O direito a olhar. Revista Educação Temática Digital-ETD. Campinas, v. 18, n. 4, p. 745-768, 2016. Disponível em: http://dx.doi.org/10.20396/etd.v18i4.8646472
IPEA. Atlas da violência: 2019. Brasília, Rio de Janeiro, São Paulo. Disponível em:
<http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=34784&Itemid=432>. Acesso em: 21 nov. 2019.
PENNA, João Camillo. O Dispositivo Questions Théoriques. Publicado no blog. Disponível em: < https://joaocamillopenna.files.wordpress.com/2017/03/dispositivo-questions-thecc81oriques-versacc83o-para-leitura.pdf >. Acesso em: 27 jul. 2020.
SILVA, Franklin Leopoldo e. Lévinas: ego e distanciamento. Entrevista concedida em vídeo e publicada no site da Casa do Saber. Disponível em:< https://www.youtube.com/watch?v=uxWBzOVQ6-o>. Acesso em: 20 jun. 2020.
Notas
[1] Livro Urbano é o nome que se dá aos escritos que o Profeta Gentileza deixou nas pilastras do viaduto no Caju, Rio de Janeiro (Yado, 2016, p.19).
[2] Nome dado pelo próprio artista Marcelo Oliveira ao seu trabalho.
[3] Marcelo Oliveira concedeu entrevista a essa pesquisadora, que ainda será publicada na tese de doutorado.
[4] Jaime Filho é motoboy de profissão, redige seus poemas entre um frete e outro, tirando das alegrias e frustrações cotidianas da rotina áspera da capital fluminense inspiração para escrever. “Daquelas Tardes no Leblon” é seu primeiro livro, uma antologia com poemas que reúne parte de sua obra. Disponível em: https://www.frutosdapoesia.com/nossos-autores e no seu Instagram @epifania.literaria.
[5] Este subtítulo é uma apropriação amorosa do nome do Instagram de Jaime Filho, @epifania.literaria.
[6] Fonte: https://edtl.fcsh.unl.pt/encyclopedia/epifania/.