Em seu influente artigo “A escultura no campo ampliado”, publicado em 1978, Rosalind Krauss apoia-se na então ainda incipiente evidência de uma lógica artística não mais modernista, e sim pós-modernista, para propor e justificar o conceito de “campo ampliado” para a escultura contemporânea. Definindo escultura como aquilo que se dá no espaço duplamente negativo de “não-monumento” e “não-arquitetura”, a crítica de arte norteamericana constrói sua argumentação problematizando a categorização modernista da escultura e concluindo, por fim, que a “escultura não é mais apenas um único termo na periferia de um campo que inclui outras possibilidades estruturadas de formas diferentes. Ganha-se, assim, ‘permissão’ para pensar essas outras formas” (Krauss, s/d, p. 91). Essas outras formas possíveis de pensar a escultura, contrariando a necessidade da pureza de mediums e da autonomia da obra de arte pregada pelo cânone modernista, situando-se no espaço aberto e maleável de uma troca dinâmica entre paisagem/arquitetura/escultura, abrem-se também para a prática artística de ocupação de vários lugares diferentes pelo artista dentro do campo da cultura e para o uso diversificado de suportes.[1]
Após estabelecer o campo ampliado da escultura, Rosalind Krauss indica que o mesmo procedimento pode ser tentado com outros gêneros artísticos e sugere, por exemplo, que a dilatação do par originalidade/reprodutibilidade possa revelar os contornos do campo ampliado da pintura. Isso é tentado por Gustavo Fares em seu artigo “Painting in the Expanded Field”. O que nos interessa no artigo de Fares é a sua conclusão de que a pintura tem, durante os séculos, perdido um território que era seu.[2] Pensando nesses termos – o da perda de um lugar e, portanto, como veremos, de uma denominação – uma observação semelhante poderia ser feita, e com maior justiça, em relação à poesia: durante os séculos de desenvolvimento da cultura ocidental ela tem perdido um território que era originalmente seu. Em uma rápida e abrangente genealogia da poesia na nossa cultura, desde suas origens gregas, onde ela ganhava contorno e status de arte total, vemos que a tradição épica, ou seja, a tradição homérica, que no correr dos anos gerou Virgílio, Ariosto, Tasso, entre muitos outros, se transformou, com a ascensão da burguesia, em romance e, com o século das imagens, em cinema.[3] Quase ninguém mais escreve longos poemas narrativos com centenas de páginas, muitos personagens e aventuras.[4] Da mesma forma, a tradição da poesia lírica inaugurada por Arquíloco (segundo Nietzsche em O nascimento da tragédia) teria se transformado, na era da cultura de massas e indústria cultural (com a facilidade da reprodução das gravações sonoras), em canção popular.[5] Hoje, são raros os poetas que se dedicam ao poema lírico (sem fazer uso da ironia) e do poema épico tradicionais.[6] Esses gêneros, naquela modelagem, foram, por assim dizer, “subtraídos” da tradição da poesia e transferidos para (e alterados em) os mediums da música, da prosa e do cinema.[7] A poesia, então, adentrou o século 20 com um trunfo que os poetas julgavam inalienável: o pensamento – justamente por ser o pensamento constituído por palavras (assim como poemas são feitos de palavras, segundo Mallarmé). Não é coincidência que muitos dos grandes poetas do século passado foram poetas do pensamento: Eliot, Pound, Pessoa, Valéry… Nas últimas décadas do século 20, no entanto, com o advento da arte conceitual, as artes visuais passaram igualmente a levar uma alta e inaudita carga de pensamento, aproximando-se da filosofia.[8] A irmandade entre poesia e filosofia tem acompanhado a cultura ocidental desde sua origem e tal aproximação tem sido objeto de estudo e debate entre poetas e filósofos há muitas gerações.[9] Restaria-nos pensar, portanto, seguindo essa trilha de pensamento, a relação entre poesia e arte contemporânea em sua confluência filosófica.
Em “Rumo a um mais novo Laocoonte”, publicado em 1940, Clement Greenberg afirma que “quando porventura se confere a uma arte o papel dominante, esta se torna o protótipo de toda arte: as outras tentam se despojar de suas próprias características e imitar-lhe os efeitos. A arte dominante, por sua vez, tenta ela própria absorver as funções das demais” (Greenberg, 1997, p. 46).[10] Ora, se há uma arte dominante hoje, ela se situa, sem dúvida, no reino das artes visuais, ou sua mais recente denominação generalizante, arte contemporânea. Para Rosalind Krauss, que foi discípula de Greenberg, o programa modernista procurou reduzir a pintura à essência de seu medium, ou seja, à planaridade. Tal processo se radicalizou de tal forma que, paradoxalmente, acabou se transformando em seu oposto: radicalizada a especificidade da pintura, ela foi esvaziada para assumir uma categoria genérica de Arte. As telas negras de Frank Stella apontaram para uma planaridade materializada,[11] abrindo caminho para os “Specific Objects” de Donald Judd – a pintura como qualquer outra coisa tridimensional (Krauss, 1999, p. 9-11).[12] Sendo como qualquer outra coisa, a pintura já não podia ser específica, e sim, geral. Desta forma, a pintura deixou de ser pintura para se tornar Arte em geral; e ser um artista passou a significar questionar a essência da Arte (em geral). Assim, o objeto físico deixou de ser necessário, cedendo lugar (ainda enquanto arte, por via da arte, e não da filosofia) à condição conceitual da linguagem.[13] Seguindo essa linha de raciocínio, Arthur Danto pode afirmar que já não há mais um critério possível que determine o que é e o que não é arte: todas as formas de mediums e estilos são legítimas. Isso significa que o artista contemporâneo, ao construir sua poética, tem à sua disposição não apenas as novas tecnologias, mas toda a arte do passado – tenha sido ela reconhecida ou não – e seus meios e estilos (com exceção do espírito em que esta arte foi realizada). “O pluralismo do mundo da arte atual define o artista ideal como um pluralista” (Danto, 1997, p. 114).
Desde logo, o “campo ampliado” pós-moderno pressupunha uma relação mais dinâmica e ambígua entre os mediums. Quase vinte anos depois da publicação de “A escultura no campo ampliado”, em 1999, num ensaio em que estuda a questão da condição pós-midiática da obra de arte contemporânea através de uma análise da obra do “(ex) poeta” belga Marcel Broodthaers, Krauss retorna criticamente à questão da crise do medium. Nessas alturas, seu desconforto com o termo “medium” é tão grande que ela tem a necessidade de abordar o assunto num prefácio:
A princípio pensei que poderia simplesmente traçar uma linha sob a palavra medium, enterrá-la como grande parte dos resíduos tóxicos, e livrar-me dela ao entrar num novo mundo de liberdades léxicas. “Medium” parecia ser por demais contaminado, por demais ideológico, por demais dogmático, por demais carregado de discurso (Krauss, 1999, p. 5).
Articulando três diferentes narrativas, Krauss traça uma genealogia da dissolução do conceito de especificidade do medium nos anos de passagem entre as décadas de 1960/1970. A primeira diz respeito ao trabalho Museu de arte moderna, Departamento das águias, uma sequência de obras que Marcel Broodthaers iniciou em 1968 e deu por encerrada em 1972, através da qual o artista destrói a ideia de um medium estético e transforma tudo em readymade, dissolvendo a distinção entre o estético e o mercantilizado e ficcionalizando a forma como esta perda de especificidade se dá. O segundo e independente ataque à especificidade do meio se dá com o advento da câmera de vídeo portátil (portapak) e o uso do vídeo entre os artistas ligados ao Anthology Film Archives, que funcionou no Soho, Nova York, no final dos anos 1960 e começo dos anos 1970. Usando o portapak para criar, Richard Serra, que, no entanto, se considerava um artista modernista, logrou trabalhar e articular o novo medium como algo agregador, um aparato, e portanto como algo muito distinto das propriedades materiais de um mero suporte físico.[14] Tal percepção é concomitante ao surgimento da TV como meio de comunicação em massa. Segundo Krauss, assim como o princípio da Águia, de Broodthaers, a TV proclama o fim da especificidade dos mediums, inaugurando uma condição cultural pós-midiática, que foi compreendida e utilizada pelos artistas. Finalmente, a terceira narrativa que vinha se somar a essas práticas artísticas inovadoras, e que a elas dava credibilidade intelectual, era oriunda das argumentações de Foucault a favor de uma interdisciplinaridade acadêmica e das proposições pós-estruturalitas e desconstrucionistas de Jacques Derrida e outros pensadores franceses.
Para Krauss, todo medium é intrinsecamente plural e, desse modo, é impossível reduzir um gênero artístico ao seu medium. O próprio Greenberg teria percebido isso ao, mais tarde em sua carreira, abandonar a ênfase na planaridade e cunhar os conceitos de opticalidade e campo de cor. Um dos argumentos principais da autora, nesse ensaio, é que “a especificidade dos mediums, mesmo os modernistas, deve ser compreendida como um diferencial, auto-diferenciado, e, portanto, uma camada de convenções nunca simplesmente redutíveis à fisicalidade de seu suporte” (Krauss, 1999, p. 53). Segundo Krauss, Broodthaers representa a complexidade da condição pós-midiática pós-moderna, e sua genialidade reside no fato de ele ter, ao usar filmes antigos, alusões ao colecionismo, auto-détournments e outros procedimentos, revelado a condição auto-diferenciada (self-differential) dos próprios mediums, alegorizando-a, ficcionalizando-a e fazendo da própria ficção um medium.
Lamentando a irônica proliferação do princípio da Águia quase trinta anos depois do trabalho pioneiro e aberto de Broodthaers, presente em todas as bienais e feiras de arte do mundo globalizado na forma de infindáveis instalações e trabalhos multimídia, funcionando como uma nova academia a serviço do capital, Krauss clama por uma prática de differential specificity (capaz de reconhecer e articular as complexidades da condição pós-midiática através da contemplação e revelação das formas já ultrapassadas que ela encerra) e define medium como algo que, para sustentar uma prática artística, “deve ser uma estrutura de apoio, geradora de uma série de convenções, algumas das quais, ao assumir o próprio medium como seu tema, serão completamente ‘específicas’ a ela, produzindo assim a experiência de sua própria necessidade” (Krauss, 1999, p. 26).
A definição de Krauss parece ressoar com o pensamento do antropólogo brasileiro Antonio Risério, que, em seu Ensaio sobre o texto poético em contexto digital, ataca o que ele percebe como um conservadorismo dentro do próprio ambiente de produção literária, e argumenta contra o confinamento da poesia no suporte livro:
Na verdade, os discursos que querem reduzir a poesia a um dos formatos que ela assumiu, ao longo de sua longa trajetória histórica, indicam para mim, nada mais que a crescente ansiedade de literatos conservadores diante das transmutações formais que presenciamos – e, em consequência, diante da impossibilidade de sustentar o caráter único ou mesmo a hegemonia do modelo gráfico que eles elegeram para o fazer poético. Mas o fato – simples – é que a arte da palavra é anterior ao espaço gráfico gutemberguiano. […] Só alguém completamente enceguecido pelo afã irracional de defender o seu sítio (ou a sua baia) escritural, frente à proliferação de signos e formas de nossa circunstância histórico-cultural, pode pretender que a materialização do poético somente seja viável através do medium gutemberguiano, pelo padrão/formato tipográfico que se estabeleceu com a impressão de textos compostos com versos livres. Os computadores, a holografia, o laser, o vídeo etc., estão aí, à nossa volta (Risério, 1998, p. 200).
Para o pensador baiano, “um poema existe quando se materializa num medium. E cada ‘meio’, além de oferecer um rol de recursos, abre um leque de exigências” (Risério, 1998, p. 46).[15] Mas o que exatamente se materializa num medium? O que é um poema? Agamben também debruçou-se, numa série de ensaios curtos, mas agudos e perfeitamente alinhados com sua proposta de crítica negativa, sobre essa questão (Agamben, 1998; 2002; 2008). Para o pensador italiano, são cinco os institutos poéticos, ou os elementos que diferem a poesia da prosa: o fim do poema (ou seja, o verso final, que se lança no silêncio), a versura (o ponto de suspensão da virada de um verso para outro – como o arado que sobe no final do campo, para retornar abrindo novo sulco – momento decisivo do enjambement), a cesura (pausa embutida no interior do verso), a rima e o enjambement, sendo este último o critério mais marcante, assim definido por ele: “a oposição entre um limite métrico e um limite sintático, uma pausa prosódica e uma pausa semântica” (Agamben, 2002, p. 142).
Poético é o texto no qual essa oposição pode se dar. Partindo da famosa definição pendular de Valéry,[16] mas privilegiando não a harmonia entre som e sentido, mas justamente sua discrepância e irredutibilidade, Agamben afirma que “todos os institutos da poesia participam desta não coincidência, desse cisma entre som e sentido” (Agamben, 2002, p. 143). O poema se define, portanto, como a sobreposição simultânea entre duas séries – a série semiótica e a série semântica, expressão e impressão, presença e ausência, som e silêncio – em atrito e crise, revelando a linguagem em sua própria diferença, em seu lugar enquanto linguagem mesma, em curto-circuito, jamais acatando a unicidade própria do discurso prosaico mas, ao contrário, mantendo a tensão de um antagonismo essencial que aponta para um constante estado de abertura, necessariamente crítico. Jean-Luc Nancy, em seu ensaio A resistência da poesia, afirma: “a poesia é igualmente a negatividade, no sentido em que nega, no acesso ao sentido, aquilo que determinaria esse acesso como uma passagem, uma via ou um caminho, e o afirma como uma presença, uma invasão” (Nancy, 2005, p. 12). Ainda Nancy: “a palavra ‘poesia’ designa tanto uma espécie de discurso, um gênero no seio das artes, ou uma qualidade que pode apresentar-se fora dessa espécie ou desse gênero, como pode estar ausente nas obras dessa espécie ou desse gênero” (Nancy, 2005, p. 9).
Para o pensador brasileiro Adalberto Müller, não se trata mais de perguntar o que é a poesia, mas sim onde ela está. Nesse campo ampliado – ou fissura aberta – o poema – como objeto de linguagem, mas não obrigatoriamente linguagem verbal – desloca-se dos seus suportes tradicionais e requer uma “base epistemológica que possibilite o trânsito seguro de uma área do conhecimento para outra” (Müller, 2012).
Nesse lugar ou lugares fronteiriços ou híbridos (espécie de limbo; invisíveis para a crítica mainstream da poesia brasileira – vide, por exemplo, a quase ausência de estudos sobre um poeta seminal como Wladimir Dias-Pino), inserem-se não poucos poetas ou coletivos brasileiros contemporâneos que de formas variadas trabalham a poesia de uma maneira plástico-performática ou que, em outras palavras, têm criado poemas em um campo ampliado. Entendem-se como “plásticas” as ações poéticas que se inscrevem simultaneamente no campo das artes visuais, notadamente a pintura, a escultura e a fotografia. Embora a performance seja um elemento já constitutivo do universo da arte contemporânea (assim como a vídeoarte[17]), suas possíveis ações extrapolam uma definição que a reduz a esse universo,[18] e evidentemente abarcam a poesia. Entre muitos, podemos lembrar o caso de Alex Hamburger (parceiro de Márcia X em várias performances memoráveis), Alexandre Sá, André Sheik e Domingos de Guimaraens, membro do Grupo UM e do coletivo Os Sete Novos,[19] apenas para citar alguns dos que hoje se inserem no circuito das artes visuais. É o caso também de Michel Melamed, poeta, ator, músico e performer, do cineasta e vídeo-artista Felipe Nepomuceno, do vídeo-poeta e fotógrafo Alberto Saraiva e do artista multimídia Ricardo Aleixo.
Outros artistas procuram manter sua “identidade” como poetas, ao mesmo tempo em que exploram e atravessam tais zonas de fronteira, embora suas produções fora do campo da “literatura” sejam raramente abordadas pela crítica de poesia: é o caso das performances do coletivo Arranjos para Assobio, ligados a UFRJ, e de poetas que expuseram dentro do Projeto Poesia Visual, no Oi Futuro de Ipanema, Rio de Janeiro, sob a curadoria de Alberto Saraiva, como Roberto Corrêa dos Santos (“Últimas notas sobre o Grande Vidro”), Lenora de Barros (“isso é osso disso”) e Xico Chaves.
Menos raro ainda é a presença da palavra no trabalho de artistas visuais, seja no título (como chave para a obra); em textos em anexo inseparáveis do trabalho (vide as narrativas de Tunga, que, aliás, define-se como poeta[20]); ou no próprio corpo da obra, como, entre muitos exemplos, podemos apontar para algumas obras de Ricardo Basbaum, Leila Danziger, Adolfo Montejo Navas (na tradição de Joan Brossa) e Rosana Ricalde (Corrêa Dos Santos; Rezende, 2011). Há ainda aqueles trabalhos que promovem diálogos entre textos e imagens, como “Morte das casas”, de Nuno Ramos – também um excelente prosador e ensaísta[21] – em diálogo direto com Drummond, ou “4 Cantos”, de Nelson Felix, indissociável dos poemas de Sophia de Mello Brenner; além de performances que se utilizam da linguagem corporal e objetos que remetem à escrita (vide Paulo Bruscky e Gabriela Marcondes, entre outros). As ações plásticas e performáticas de poetas brasileiros contemporâneos obviamente não se esgotam nesses rápidos exemplos; no entanto seria interessante, e até mesmo urgente, estudar os rumos da poesia brasileira a partir da perspectiva que elas abrem.
* Renato Rezende é graduado em literatura espanhola pela Universidade de Massachusetts, Boston, EUA, e mestre em Arte e Cultura Contemporânea pela UERJ. Como poeta, é autor de Passeio (2001), Ímpar (2005) e Noiva (2008) entre outros, recebendo a Bolsa da Fundação Biblioteca Nacional para obra em formação em 1997, e o Prêmio Alphonsus de Guimaraens da Biblioteca Nacional para o melhor livro de poesia em 2005.
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Notas
[1] O movimento neoconcreto brasileiro, que incluía Hélio Oiticica, Lygia Pape, Lygia Clark e o poeta Ferreira Gullar, entre outros, foi pioneiro em práticas artísticas que exercem intervenções no campo social e interatividade e, referindo-se a tais práticas, o crítico Mário Pedrosa foi um dos primeiros intelectuais no mundo a cunhar o termo “pós-moderno”.
[2] “Gostaria de conjeturar que a ‘pintura’ tem ‘cedido’ através da história parte do território que conquistou para si cinco séculos atrás, se não antes, e que essa ‘expansão’ é testemunhada pelas diferentes formas e mídias que prevalecem hoje. A narrativa, por exemplo, foi apropriada pelo vídeo, enquanto que a importância de ‘ver’ e de ‘estar presente’ parecem ter passado para o reino da instalação e das artes performáticas, nas quais o espaço real é um componente importante do trabalho. A ‘mensagem’, se algum dia existiu, tem sido esvaziada da pintura e assumida pelos críticos, ou pelos próprios artistas, como uma atividade verbal, em paralelo e não necessariamente relacionada aos trabalhos de arte sendo produzidos…” (FARES, 2004, p. 477-487). Entre nós, um estudo que se dedica ao campo ampliado da pintura é Pintura em distensão, de Zalinda Cartaxo (2006).
[3] Para Susan Sontag, o cinema é um subgênero da literatura (Sontag, 1987, p. 21).
[4] Exceções, que provam a regra são Latinoamérica, de Marcus Accioly (2001) e o recente Uma viagem à Índia, de Gonçalo Tavares (2010).
[5] Francisco Bosco, poeta e letrista de música, além de ensaísta, possui um curto, mas definitivo ensaio sobre o assunto. Segundo ele (2007): “A poesia é uma potência, atualizada ou não, da letra. A letra, sem deixar de ser letra, pode ao mesmo tempo tornar-se poesia.”
[6] Segundo Paulo Henriques Britto, o poema épico, ligado à construção de uma nação, extingue-se com a construção do estado moderno, e a última epopeia incorporada ao cânone foi Os Lusíadas, que já contêm elementos poucos ortodoxos ao gênero (o não enaltecimento incondicional da pátria, por exemplo). O poeta lírico, por outro lado, afirma uma individualidade, ou melhor, uma subjetividade. O principal elemento da poesia lírica é a memória do poeta, com cujas experiências e vivências interiores o leitor se identifica. Para o tradutor e poeta brasileiro, vivemos no Brasil atual uma predominância de uma poesia pós-lírica, na qual o “eu lírico” é, acima de tudo, uma encruzilhada de textos: “Dois traços, porém, me parecem característicos da poesia pós-lírica: a tendência a dar mais importância à intertextualidade do que à experiência não literária; e a tendência a exigir do leitor um cabedal de conhecimentos de tal modo especializado que a leitura só se torna viável se for feita paralelamente com uma série de notas e explicações” (Britto, 2000, p. 124-131).
[7] “Boa parte da experiência humana de que tratavam a poesia lírica e a épica é eliminada de antemão; alguns poetas pós-líricos dão a impressão de que a condição humana – as contingências da carne, as paixões, a mortalidade – são temas que só devem ser tocados com as pontas dos dedos, se não evitados de todo e relegados à canção popular ou ao cinema” (Britto, 2000. p. 130).
[8] De acordo com Danto: “Os filósofos da arte e o mundo da arte agem como duas curvas opostas que se tangenciam em um único ponto e depois se desviam para sempre em direções diferentes. Isso acaba reforçando a hostilidade própria dos artistas, desde Íon… […] E assim as coisas teriam permanecido indefinidamente não tivesse a arte evoluído de tal forma que a questão filosófica de seu status quase se converteu em sua própria essência. […] Hoje em dia, às vezes é necessário fazer um esforço especial para distinguir a arte de sua própria filosofia. É quase como se a totalidade das obras de arte tivesse se condensado naquela parte delas mesmas que sempre foi do interesse dos filósofos…. A arte é praticamente uma confirmação da teoria da história de Hegel, segundo a qual o Espírito está destinado a tornar-se consciente de si” (Danto, 2005, p. 101-102).
[9] No contemporâneo, por exemplo, tal discussão é articulada por Giorgio Agamben de forma disseminada em vários de seus escritos, mas especialmente em A linguagem e a morte (2006). Entre nós, o poeta e filósofo Antonio Cícero tem se dedicado ao tema em livros como Poesia e filosofia (2012).
[10] Através de um entendimento e de uma prática das artes como mimese, é possível traçar um percurso de traduzibilidade entre elas (ou seja, as artes como tecné, e equiparáveis entre si em suas diferentes maneiras de imitar o mundo). A questão se problematiza e sofre uma guinada com o advento do modernismo e seu incessante estado de crise, quando as artes deixam de ser representativas e se voltam aos seus próprios mediums (perdendo, desta forma, sua capacidade de traduzibilidade mútua).
[11] Por planaridade materializada Krauss se refere às faixas brancas por onde, segundo Stella, a pintura respirava em telas como a série The Marriage of Reason and Squalor (1959). Tal procedimento é idêntico ao usado por Lygia Pape em sua série Tecelares (1958), e as palavras de Krauss para a obra de Stella poderiam ser integralmente usadas para a obra de Pape, como fica provado em Herkenhoff (2012).
[12] Seria interessante pensar tais conceitos em relação à teoria do não-objeto neoconcreto.
[13] Em A linguagem e a morte Giorgio Agamben pergunta: “Se a filosofia se apresenta desde o início como um “confronto”… e uma “diferença”… com a poesia […] qual é a extrema experiência de linguagem própria da tradição poética?” (Agamben, 2006, p. 91). Tal questão permeia boa parte da obra do filósofo italiano. Em Estâncias, Agamben parece apontar a solução dessa crise – “a urgência para que a nossa cultura volte a encontrar a unidade da própria palavra despedaçada” – na manutenção da abertura alcançada pela prática de uma crítica negativa, ou seja, uma crítica – que nasce no momento em que a cisão entre a poesia e a filosofia alcança seu ponto mais extremo – já não dedicada à análise de um objeto que lhe é exterior e que ela procura apreender, mas ao questionamento de sua própria presença: daí seu encontro com a arte – e com o pensamento filosófico. Neste sentido, a poesia seria uma abertura sempre mantida em aberto, a constante renovação de uma ferida enfim exposta (Agamben, 2007, p. 13).
[14] Novamente, traçando um paralelo com o que acontecia no Brasil, seria interessante pensar na produção dos pioneiros da videoarte no país, especialmente no Rio de Janeiro, como Sonia Andrade, Letícia Parente e Ana Vitória, entre outros, que, com uma câmera emprestada, produziram obras ainda contundentes, que não se filiam nem à dicotomia Concretismo/Neoconcretismo nem à Nova Figuração.
[15] Para Risério, o poema que desguarnece as fronteiras com outros mediums, formando produtos híbridos ou multimídia – sempre, para ele, a partir da palavra – pode ser chamado de ‘texto intersemiótico’: “A poesia é a arte da palavra também no sentido de que é, à sua maneira, arte da insatisfação humana diante dos limites da linguagem. À falta de expressão melhor, pode-se chamar ‘texto intersemiótico’ o poema que não se contenta com a permanência nos domínios incontestáveis da semiótica verbal. Ao apelar para outros códigos, ele se situa numa zona de fronteira” (p. 58).
[16] Em alguns estudos seminais (especialmente “Questões de poesia”, “Primeira aula do Curso de Poética” e “Poesia e pensamento abstrato”) Paul Valéry investiga com rigor a natureza da poesia. Para o autor de Cemitério marinho “um poema é uma espécie de máquina de produzir o estado poético através das palavras”, ou seja, capaz de transportar o leitor à esfera do poético, torná-lo inspirado. Tal máquina (o poema), capaz de recriar no leitor a experiência do poeta, funciona na troca harmoniosa do movimento pendular entre som e sentido (Valéry, 1999, p. 169-210).
[17] Expando o tema específico da relação entre poesia e vídeoarte em Rezende, Renato. “Poesia e video-artes: algumas aproximações”. Revista Z Cultural, ano VII, n 2. http://revistazcultural.pacc.ufrj.br/poesia-e-video-arte-%E2%80%93-algumas-aproximacoes-de-renato-rezende/
[18] Como lembra Daniela Labra: “No campo artístico, o termo performance (ou performing arts) é abrangente, podendo ser aplicado a qualquer prática em que o corpo está presente, seja dança, artes cênicas, circo ou mesmo uma apresentação musical” (Labra, 2008).
[19] Para uma introdução ao fenômeno de coletivos na cena artística brasileira contemporânea, ver: Rezende; Scovino, 2010.
[20] “Eu me coloco na posição do poeta porque eu acho que poesia não é e coisa escrita ou a poesia falada ou a poesia cantada ou a poesia feita objeto. É o que está por trás da poesia, e isso é texto em qualquer forma, através de qualquer linguagem. E a gente pode usar, pode manipular, qualquer campo da linguagem para ascender a esse território. Esse território é o quê? É o território da densidade máxima da experiência da linguagem.” Entrevista concedida a Sergio Cohn, Pedro Cesarino e Renato Rezende (Tunga, 2008).
[21] Nuno foi incluído por Paulo Ferraz em sua antologia de poetas brasileiros surgidos nos anos 1990 (Ferraz, 2011).