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QUESTÕES NEGRAS

Quando fomos convidadas por Heloisa Buarque de Hollanda e Beatriz Resende para organizar um número da revista Z Cultural sobre “Questões negras”, pensamos nas diversas dimensões que o tema poderia sugerir. E entendemos que, para além daquilo que afeta direta e especificamente os afro-brasileiros na contemporaneidade, “Questões negras” são também os questionamentos que a “comunidade negra” levanta para gente de todas as cores. Questões de justiça e desigualdade, certamente, mas também questões de produção cultural e valor. Elas são de interesse para brancos e negros, negras e brancas.

Assim, nossas discussões nos levaram a querer fazer uma revista que falasse do trânsito destas questões no cinema, na educação, na filosofia, na música popular, nas cidades. Trânsito de bola de bilhar que muda trajetórias, muda de trajetória. É neste sentido que trazemos textos de grandes pensadores da identidade negra, como Milton Santos, que em entrevista rememorou sua formação inicial, e Stuart Hall, em uma conferência em que investiga por que não conseguimos nos livrar do suposto fundamento biológico de “raça”.

Também estão aqui textos de pessoas que observam a paisagem em que as questões negras aparecem: Renato Noguera, conectando o drible à filosofia; Katia Santos, sobre a negritude do mundo do carnaval; Marcia Contins sobre as religiões afro-brasileiras no Rio de Janeiro e sua trajetória de pesquisa; Maria Carolina Godoy sobre as qualidades da escritora negra Conceição Evaristo; Rosângela Araújo, a Mestre Janja, sobre a epistemologia da capoeira; e uma entrevista com o cineasta Joel Zito Araújo que discute sua experiência com o cinema, o racismo e o gênero. As questões negras nunca são estanques. Embora muitas vezes sua discussão se confina a especialistas, elas extravasam. O mesmo ocorre com questões feministas. Para tirar estas do gueto, publicamos um texto de Angela McRobbie, que conecta gênero e feminismo à raça, pós-colonialidade e valores “pós-feministas”.

Nós, as organizadoras, somos todas pesquisadoras ligadas ao Programa Avançado de Cultura Contemporânea (PACC) da UFRJ. Temos interesses, posições e visões diferentes sobre as questões negras. Só uma das quatro é negra. Nossas formações profissionais também não são as mesmas: há uma antropóloga, duas da área de Letras, uma de Comunicação. Mas trabalhamos em harmonia, cada uma fazendo o máximo para publicar textos que possam instigar o público leitor – o que esperamos ter conseguido. As hierarquias acadêmicas não nos serviram para decidir como assinar esta nota editorial, pois cada uma ocupou um papel diferente e fundamental. Por isso, preferimos assinar como se fôssemos um grupo vocal:

As organizadoras
(Liv Sovik, Katia Santos, Maria Carolina Godoy, Patrícia Farias)