Ano XIII 0201
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ELEMENTOS DE UMA CENA MUSICAL ALTERNATIVA EM CAMPINAS – SP (1980-2013)

Resumo: Como todas as grandes cidades brasileiras, marcada pela desigualdade socioterritorial, Campinas, importante cidade da rede urbana paulista, abriga um vigoroso circuito de música alternativa aos grandes meios de informação. Grosso modo essa cena se dinamiza desde meados de 1980 em torno de bares com música ao vivo, estúdios fonográficos e emissoras de rádio, a maioria desses fixos de existência efêmera. Hoje em Campinas, dos quase 60 bares com som ao vivo, apenas sete deles têm abertura para sons alternativos e para a produção musical local. Inventariamos ainda a existência de dez gravadoras em atuação na região, boa parte delas fazendo a conexão com os grandes circuitos da economia. É nosso intuito destacar essa parcela da produção fonográfica que permanece pouco difundida nas cidades. Queremos refletir sobre as possibilidades de resistência dos lugares frente aos padrões impostos pela indústria cultural.

Palavras-chave: Campinas, cena alternativa, território, música.

Abstract: Like all Brazilian large cities, marked by socioterritorial inequality, Campinas, important city of São Paulo urban network hosts a vigorous music circuit alternative to mainstream media. In general terms, this scene becomes dynamic since mid 1980 around bars with live music, phonographic studios and radio stations, most of these places with ephemeral existence. Today in Campinas, of nearly sixty bars with live sound, only seven of them are open to alternative sounds and local music production. Inventoried yet the existence of 10 labels in action in the region, many of them making the connection to the great circuits of the economy. We aim to highlight this portion of the phonographic production remains little known in the towns. We want to reflect on the possibilities of resistance front of the standards imposed by the cultural industry.

Keywords: Campinas; alternative scene; territory, music.

 

Introdução

Núcleo de uma região-chave[1] da rede urbana (Geiger, 1963) paulista, Campinas atualmente com 1.144.862 habitantes (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística- IBGE, estimativa 2013) abriga uma pulsante produção musical alternativa aos grandes meios de informação, que se movimenta na cidade desde meados dos anos 1980. Propomos esmiuçar, a um só tempo, essa produção musical e o movimento do território a partir da noção de circuito sonoro[2], entrada para melhor compreender a situação concreta resultante do processo de espacialização de normas, materialidades, ações e formas, que a partir dos usos mediados pela técnica, dinamizam o espaço geográfico e os seus lugares em Campinas.

Santos (1999, 2004) explica que no lugar dá-se a proximidade, a copresença, a troca, bem como a resistência, seja por meio da contestação, da espontaneidade ou da criatividade. Acreditamos que a força da produção musical alternativa está na sua ligação com o lugar e com as demandas cotidianas associadas ao fato de se tratar de uma produção diversa por excelência, jamais compondo uma proposta alternativa no sentido estético. Ao contrário, o alternativo tem sua formação na não unidade estética, e remete às atitudes contra o estabelecido, por meio da pluralidade, do desprendimento e da insistência, que, por vezes, resultam em manifestações de vanguarda, durante certo período, necessário para ações de enquadramento perpetradas pela indústria cultural.

Lembra-nos, nesse viés, Tragtenberg (1991, p. 25) que “a música contemporânea também possui o seu código sonoro típico, o seu dialeto, ou seja, seu repertório padrão”, uma espécie de constante de informação média chamada de repertório médio[3]. Ora, essas espessuras alternativas presentes nos circuitos culturais campineiros representam uma resposta dos lugares a toda uma cultura média (padrão), que condiciona o que pode ser dito, encenado, escrito ou gravado.

Propomos uma abordagem que parta das situações residuais da produção fonográfica, momento do circuito sonoro que não adere ao repertório médio nem às práticas a ele vinculadas. Uma produção que mesmo não estando totalmente fora do esquema de difusão espetacular (Debord, 1967)[4], seja por contrato com uma distribuidora, ou ainda pelo pagamento de ‘jabá’ (a propina do rádio) para divulgação em emissora concessionada[5], encontra-se à margem de uma grande produção justamente pela postura estética e política adotada.

Em nossa pesquisa, além do levantamento bibliográfico e documental sobre a temática, realizado, entre outros, em livros, dissertações, teses, artigos de jornais, artigos de periódicos, material fonográfico, cartazes de eventos, foram essenciais as informações primárias reunidas  – entre os anos de 2007 e 2008 – por meio de: i) cerca de 60 entrevistas semiestruturadas com agentes ligados à temática (músicos, produtores fonográficos, radialistas, articuladores culturais, entre outros), espécies de diálogos buscando aclarar as redes de contatos estabelecidas em torno do circuito sonoro campineiro; ii) visitas a lugares conformados ou apropriados por esse circuito (bares, estúdios fonográficos, casas de shows, emissoras de rádio, gravadoras, entre outros). Tais informações encontram-se no texto acompanhadas por um asterisco*.

Trabalhamos a noção de resíduo sonoro para analisar os momentos do circuito musical que irrompem em Campinas escapando da docilidade incutida pelos grandes meios de informação, baseando-se antes de tudo em demandas cotidianas. Tratar-se-ia de uma entrada para examinar o potencial comunicativo da cidade atual.

Iniciamos os trabalhos apresentando um inventário dos bares com som ao vivo e dos estúdios fonográficos relacionados à produção alternativa desde meados dos anos 1980 em Campinas. Em seguida abordamos a existência do critério musical no rádio FM concessionado campineiro, uma programação de exceção, em um circuito largamente regido por critérios mercadológicos. Esses momentos residuais do circuito sonoro sinalizam para a não preocupação em reproduzir os modelos estético-políticos consagrados pela mídia massiva. Associam-se aos lugares e às suas situações de encontro, por meio de um circuito responsável por dinamizar a parcela menos rentável financeiramente do circuito sonoro Campineiro.

Num segundo momento destacamos o inventário em torno dos selos (gravadoras) da região de Campinas. Tais prestadores de serviços fonográficos são as conexões em potencial com os grandes circuitos da economia presentes na produção fonográfica; podem desse modo nos auxiliar nas discussões sobre a drenagem do saber sonoro intrínseco ao circuito sonoro por parte das grandes corporações.

O residual nos lugares do circuito sonoro: a cena alternativa em Campinas

Com a cena almejamos discutir a centralidade dos contatos, articulações, elos cooperativos e toda sorte de situação de encontros e transmissão de informações, no âmbito do circuito sonoro mais ligado à informação ascendente, aquela fundada nos lugares, força motriz da cena alternativa campineira. A respeito da cena, diz-se que ela “acontece” e refere-se à espessura (presença) que uma manifestação artística adquire num dado lugar. Enquanto o segmento se refere ao mercado, a cena se aprofunda no mundo de relações, um circuito rico de informações do diverso e do maleável, embasado mais em trocas do que em imposições.

A esse termo, recordamos que as inquietações acerca das experiências musicais no lugar, entendido como o lócus da vida humana, merecem atenção. Ora, o circuito sonoro articula-se com diversos outros circuitos (culturais, políticos ou econômicos), e a densidade comunicacional (Santos, 2004), necessariamente ligada às demandas cotidianas, é um dos componentes que podem ajudar a entender e aprimorar o contato entre as diversas cenas, as quais, em comum, teriam a motivação artística e o desejo de transmitir o diverso.

O saber sonoro, um capital conhecimento (Gorz, 2005) nutrido pela experiência cotidiana dos sujeitos, pode ser uma das bases para o estudo dos elementos do circuito sonoro ligados às espessuras da densidade comunicacional. Essas espessuras se baseiam mais nas práticas e nas ações e toda sorte de articulação, do que em materialidades (edifícios e demais construções fixas, sistemas técnicos ou informacionais, entre outros). Tais densidades do cotidiano mantêm pontos efêmeros nos lugares, potencialmente condutores da construção de algo novo. Daí sua importância qualitativa e não utilitarista ou numérica.

Em nossa análise da cena musical alternativa em Campinas, problematizamos os conflitos e as associações entre circuitos de informação ascendentes e descendentes no território. Segundo Santos (1994, 2004), os circuitos informacionais ascendentes, ou de baixo para cima, fortemente presentes na Cena, se referem à parte dos lugares que insurge em ações cotidianas de interesse comum, portadoras do novo, ligadas à comunicação, está necessariamente ligada à troca de experiência entre os sujeitos. Por outro lado, os circuitos informacionais de cima para baixo, ou descendentes, são aqueles baseados em demandas externas, por vezes criadores de espaços rígidos, logo portadores de lógicas e normas fundamentadas na obediência e na disciplina. Esses circuitos de cima para baixo chegam aos lugares dinamizados por uma integração funcional e um maciço sistema de objetos técnicos (receptores ou antenas de rádio, televisores, celulares, entre outros), cuja função pode ou não, ser subvertida. Tratar-se-ia em larga medida do oferecido pelo enquadramento orquestrado pela produção fonográfica sob a égide das grandes empresas do disco, as chamadas majors, operantes para além da cena alternativa.

Daí para Adorno a música de consumo implicar a morte da comunicação:

…parece que tal música contribui ainda mais para o emudecimento dos homens, para a morte da linguagem como expressão, para a incapacidade da comunicação. A música de entretenimento preenche os vazios do silêncio (1980, p. 166).

Deixa-se de lado a insurgência e serve-se ao sucesso. Adorno (1980, p. 181) chama esse processo de “audição regressiva”, com a não compreensão do material sonoro que “relaciona-se manifestamente com a produção, através do mecanismo de difusão, o que acontece precisamente mediante a propaganda”, tornada o elo da parada de sucesso e de sua programação padrão escolhida por critérios de mercado, aspecto fortemente presente do circuito de radiodifusão FM como um todo.

Hoje, a primazia da indústria cultural no circuito fonográfico difundindo o repertório médio nos remete às noções de sistemas de ação deliberada e de estrutura de enquadramento:

Chamemos de sistemas de ação deliberada aqueles instrumentos elaborados na superestrutura do sistema social destinados a conter, pela persuasão ou pela força, os ímpetos de ação dos que se situam nas camadas mais pobres. Chamemos de estruturas de enquadramento aqueles elementos do sistema social cuja eficácia, no sentido de imprimir comportamentos passivos, pertence a própria lógica do sistema e cuja ação, desse modo, até pode ser considerada como espontânea, mas não inocente (Santos, 1990, p. 188).

No intuito de refletir sobre essa questão, trazemos para a discussão, entre outros, os estudos de Vicente (1996, 2001) e Frith (1988, 2004), que expõem a relação entre as novas tecnologias da informação e a produção fonográfica no contexto de industrialização e intensa drenagem dos microcircuitos da música pelas grandes empresas de informação.

O inventário a seguir busca contribuir para o exame dos processos comunicativos que escapam ao enquadramento no período atual e das formas-conteúdo drenadas pelas grandes corporações do disco. Manifestos em diversos momentos do circuito sonoro, entre os quais aqueles ligados à divulgação da produção, à repartição das divisas, bem como ao uso do capital conhecimento nos circuitos culturais, tal empiria parece por em relevo ricos elementos para o estudo do lugar e das possibilidades de resistência no cotidiano das cidades.

Em oposição à atual preponderância de músicos competentes no circuito de bandas cover, as quais em larga medida reproduzem a programação difundida pelos grandes meios de informação, destacamos a seguir o circuito em torno dos sons autorais: seus bares com som ao vivo, estúdios fonográficos e difusão no circuito de rádio FM. Trata-se da produção musical própria que, não reproduz um repertório de músicas de ampla difusão já existente e, pode desse modo, descortinar os caminhos tomados pela produção fonográfica campineira.

A produção musical alternativa no circuito dos bares com música ao vivo em Campinas

Desde meados da década de 1980, acompanhando o fenômeno alternativo no Brasil, se adensam elementos de uma cena residual na cidade de Campinas. No ano de 1984 surge o Ilustrada, um dos primeiros bares com abertura para sons autorais da cidade. Localizado num lugar em frente ao Centro de Convivência, chamado de ‘Setor’, o Ilustrada foi fundado por Camilo Chagas e abrigou gêneros diversos até 1993, ano em que o rock entra na programação, e antecede o fechamento da Casa.

Agentes do circuito* afirmam que o Ilustrada conseguiu reunir pessoas interessadas em música, ajudando a explicar uma certa efervescência na cena musical de então. Vale mencionar ainda nessa época o Bar 91, na Avenida Norte-sul (área central da cidade), onde aconteciam apresentações de jazz, e o Bar Anônima, no Taquaral, que recebeu diversos grupos de som alternativo em geral, explicam* os trabalhadores culturais da cidade.

Ainda na linha dos sons diversos e da abertura para propostas autorais, o Bar SOHO sucede o Ilustrada em Campinas, ao se instalar para abrigar gêneros e estilos como o ska, o reggae, o rock, entre outros, num grande volume de produção alternativa aos grandes meios de informação.

Em 1996, surge o bar Tribo Urbana, na Rua das Hortênsias, na Chácara Primavera, norte da cidade, resgatando grosso modo a proposta do Ilustrada. Em 2000, a Casa muda de nome para OZZ, então sobre a direção de Daniel Ete, trabalhador cultural da cidade, que dirigiria ainda o Bar 54 na Avenida Brasil (área central) durante o ano de 2001. No final da década de 1990, surge o Bar do Zé no Distrito de Barão Geraldo, zona norte da cidade, inicialmente na Avenida Santa Isabel em frente à Moradia Estudantil da Unicamp e mais recentemente próximo ao centro do distrito.

De acordo com um levantamento por nós realizado em sítios de produtos e serviços de lazer de Campinas, a cidade possuiria aproximadamente sessenta bares com som ao vivo. Sabemos que essa amostragem corresponde a números aproximados e, possivelmente, demonstram apenas a parcela mais visível do lazer sonoro da cidade. A topologia desses locais de lazer sonoro mostra uma concentração de praticamente metade deles no Cambuí e em Barão Geraldo, duas das áreas de maior poder aquisitivo da cidade[6]. Ao que consta, com algumas exceções, nestes locais predomina o repertório médio, com pouca ou nenhuma participação de sons autorais e inserção em promoções das emissoras de rádio concessionadas.

No ano de 2013, sete bares em Campinas tinham maior abertura para a produção alternativa e os sons autorais, recebendo regularmente bandas das cenas da cidade, da Região e do país. São eles: Hammer (Taquaral), Bar do Zé (Barão Geraldo), Zirigdum (Fazenda Santa Cândida), Woods e Delta (Jardim Chapadão), Mog (Jardim Campinas), e Toca do Urso (DIC I).

É importante lembrar que no circuito alternativo a apresentação ao vivo é uma das poucas formas de divulgação, devido em especial, aos monopólios dos meios de informação em massa. Entretanto, trata-se de uma divulgação poderosa, pois feita pelo próprio músico e repercutida a partir da situação de encontro com o público da cena. A divulgação durante os eventos musicais, sobretudo em festivais, compreende ainda a venda de camisetas da banda, CDs, fanzines, entre outros.

Entre os festivais e festas da Região de Campinas que reúnem bandas do circuito alternativo, destacam-se o Festival Auto Rock, no ano de 2013 em sua sétima edição[7] (em Campinas); o Festival Americana Independente e a Festa Privada (em Americana); e mais recentemente, alguns eventos musicais sem periodicidade definida realizados na Estação Cultura (centro de Campinas), entre outros.

Sob diversos aspectos, a mídia alternativa em torno da cena indica circuitos com espessos componentes comunicacionais. Na divulgação dos eventos musicais, prepondera a colagem de cartazes (os chamados lambe-lambe) e mais recentemente o uso da internet e de suas redes sociais, que, ao que parece, ganham vulto como forma de divulgação complementar e não substitutiva em relação aos cartazes de papel. O cuidado com o trabalho final faz dos cartazes por si só atrações à parte.

Os locais de instalação dos cartazes estão relacionados ao tipo de público que irá ao evento musical. Por se tratar de uma via de acesso no Centro, onde circulam pessoas de diversos lugares da cidade, explica a militância local*, a fixação de cinquenta cartazes na Rua Francisco Glicério trazia pessoas de diversos lugares ao evento, no ano de 2009, existiam em Campinas cerca de trinta locais definidos para a exposição de cartazes, o que seleciona o público (Figura 1).

Figura 1 - Ponto de cartazes na Loja Chop Suey no Centro de Campinas Fonte: autoria própria, 2008
Figura 1 – Ponto de cartazes na Loja Chop Suey no Centro de Campinas
Fonte: autoria própria, 2008

Nessa via, os fanzines, informativos comuns às cenas culturais, antes impressos e hoje cada vez mais em formato digital, se destacam não apenas pelos seus conteúdos diferenciados e ideias plurais, mas pela quantidade de títulos e temas. Entre tantos outros, destacam-se os zines de Campinas e Região: Mosh, Trampo pra Minas, Ideia Quente, Passa Bola, Por nós Mesmos, Improviso, e os paulistanos Fudido e Xerocado ou o Poeira Zine.

Os estúdios fonográficos e o registro das bandas alternativas da Região de Campinas

Relaciona-se à espessura residual para uma produção alternativa seja nos bares e eventos com som ao vivo ou nos meios de informação, uma espessura igualmente residual para o circuito de bandas alternativas, no que se refere ao seu registro sonoro: estúdios e selos, as pequenas gravadoras, sem ligação direta com as grandes corporações do disco.

Os produtores fonográficos mais antigos explicam que até meados da década de 1960 não se produzia bandas em Campinas*. Ao longo da década de 1970 desenvolvem-se, ainda timidamente, a produção de bandas de rock, bandas de baile, entre outros. A prática passa a se tornar comum apenas no final da década de 1980, com o aumento do número de bandas e o barateamento dos custos envolvidos na produção, o que destaca a produção realizada por estúdios, os quais supriram a demanda de uma primeira eclosão no número de bandas.

Alguns estúdios concorreram para a produção de bandas da cena campineira na primeira metade dos anos 1990, inclusive estúdios que mais tarde se especializariam em publicidade, caso do Dimas Estúdio, entre outros. A maioria desses fixos já não existe. Neles registrou-se sonoramente uma rica parcela do capital conhecimento, que movimenta um circuito definido como “debaixo do solo”, e que irrompe residual e aleatoriamente.

Em 1992 o produtor Caio Ribeiro instala o estúdio Arena localizado na Avenida Guarani no Jardim Proença, centro da cidade. O produtor Tarcísio*, explica que na época outros estúdios concorriam para a produção de bandas, como o Estúdio Ômega, de Paulo Daniel, o Estúdio 0db, de Alexandre Maiorino, entre outros. Tarsa, como é conhecido, trabalhou no Arena, onde aprimorou o conhecimento para abrir seu próprio estúdio, o Basement, no ano de 1997, no Bairro Nova Campinas. O estúdio surge aproximadamente na época do fechamento do Arena, em parceria com Caio Ribeiro. A estes produtores, coube o trabalho de gravar a parcela “menos rentável” do circuito sonoro, o que suscita um momento também residual do ponto de vista da produção em si, como explica Tarcísio*: “A fatia do mercado que eu faço (…) é do pessoal das bandas de rock, que em geral é quem está juntando o dinheiro, e você acaba dando uma força na produção, conversando com a banda, fazendo a mixagem render legal…”

O Basement com o tempo se torna referência para a gravação de bandas de toda a região de Campinas. Mais da metade do que foi gravado corresponde a músicas de autoria própria, predominantemente rock, e em menor proporção o rap, entre outros gêneros (Figura 2).

Figura 2 - Adesivo do Estúdio Basement
Figura 2 – Adesivo do Estúdio Basement

Na segunda metade da década de 1990, além do Basement, destacou-se no trabalho com as bandas, o estúdio Big Note (Bosque) e uma concentração de estúdios no Distrito de Barão Geraldo: Mad Dog, Canil, Piranha e Face Ácida, nenhum deles em funcionamento atualmente.

Nesses fixos ficaram registrados trabalhos de bandas e grupos de Campinas e de toda a região, como Benedita, Cactus Jam, Neighboors, Línguachula, Muzzarelas, Letal Charge, Concreteness, Maguerbes, X Fear, Non Sense, Coice de Mula, Prole, Smells, Strepito, Rruga, Zero Treze, Portal do Ventre, Grease, Del-O-Max, Suíte Number Five, Albano, Face Obscura, Tolerância Zero, Anjos da Anarquia, Conexão 03, Fagotte jazz, entre outros. Trata-se de uma importante espessura comunicacional, presente numa produção musical que muito tem a dizer sobre a cidade, seus lugares, conflitos e criações.

O critério musical no FM campineiro: alternativas ao repertório médio no circuito concessionado

Em trabalhos anteriores (Alves, 2008) contatamos que no circuito de rádio FM concessionado campineiro predomina a ação em rede. Tais redes são controladas por grandes grupos de informação, vinculadores de conteúdos e/ou detentores de emissoras. Lopes (1997, p. 325) lembra que no Brasil o sistema de concessões para radiodifusão é “extremamente autoritário e concentrado”, com pouquíssimas exigências para a escolha do concessionário e sem qualquer impedimento à formação de oligopólios ou monopólios.

Em Campinas, a produção musical local pouco se insere nas programações das emissoras concessionadas, menos ainda a produção alternativa ao repertório médio. Apenas a programação das rádios livres escapa ao repertório padrão, com abertura para a produção musical local.

Já não é novidade que praticamente todas as emissoras concessionadas estão comprometidas com os grandes circuitos da economia, por meio da publicidade, inclusive concorrendo com os estúdios fonográficos, fornecendo serviços de fonogramas publicitários, processo atrelado à difusão de um repertório fundamentado em padrões musicais (Lucca, 2002), baseado em critérios de mercado.

Nessa via, afirma-se entre os locutores do circuito FM*, que um dos problemas decorre da precarização do trabalho das emissoras, na medida em que o locutor se transforma em técnico e, a partir desse momento, não necessariamente deve ter conhecimento da esfera musical.

Cumpre destacar, porém, que, no circuito FM campineiro desde meados de 1980, as programações das emissoras Morena e Cultura e, mais recentemente, a programação da Educativa FM (101,9 mHz), pertencente à Prefeitura Municipal de Campinas, se basearam em critérios musicais, contribuindo para ampliar a comunicação nos lugares.

Com acervo de mais de vinte mil registros sonoros, criado ao longo dos anos, comprado em sebos, junto a colecionadores ou a partir de doações, a Rádio Morena foi por 16 anos uma opção às paradas de sucesso; todavia em 2002 foi arrendada para a Igreja Universal. O fim da rádio e a nova programação evangélica causaram lamentos dos artistas e produtores da cidade. A escolha da programação era feita por músicos e apreciadores como José Carlos “Barba”, atualmente na Rádio Educativa e Cynthia Goulart. Transmitindo com 50 kilowatts de potência, a Morena FM tinha em sua programação de música brasileira ao jazz. A emissora abrangia Campinas e outros 75 municípios, e a audiência somava cerca de 4 milhões de ouvintes em todo o interior paulista. O proprietário Natal Gale informa que o auge da emissora foi de 1985 a 1990, e esclarece os motivos do arrendamento: “No período de crise da Morena, que durou um ano até ser arrendada, o número de anunciantes girava em torno de dez. O normal de uma rádio FM é ter 50 anunciantes”[8]. Quatro meses depois de extinta, os dois programas de maior audiência da rádio voltam, fazendo parte do dial de outras emissoras: o Big Bands (apresentado por Hermano Henning) na Cultura FM de Amparo, e o Intermezzo I (apresentado por Marcos Padilha) que foi para Educativa FM com o nome de Momento Musical. Padilha afirma ser contra a segmentação, “o ouvinte deve ter acesso a tudo para escolher o que quer, o que lhe agrada”[9].

A Programação diversificada era característica também da Rádio Cultura: blues, rock, jazz, instrumental apresentados por Fred Jorge, Fernando Carani, Ayrton Martini, Vera Pessagno, entre outros. No final de 2000, a emissora pertencente a Paulo Pedroso se torna CBN, ligada ao Grupo Rede Globo:

O Sistema Globo de Rádio trabalha com pesquisas e chegou a conclusão de que existia uma demanda muito grande por jornalismo em FM. E o perfil do ouvinte de FM é mais jovem, ao passo que o de AM é mais conservador. O público que está entre 25 e 40 anos, que tem o poder de compra, estava órfão de rádio jornalismo em FM (Correio Popular, 2000).

Interessante, pois, foi justamente a Rede Globo reservar uma rádio para música escolhida a partir de critérios musicais. A segmentação de mercado permite tal distorção.

Alternativa às paradas de sucesso destaca-se, ainda hoje, apenas a programação da Rádio Educativa, com abertura para a produção local prevista por lei[10]. Entro outros, destaca-se o Programa “Som na Caixa” de Júlio Manzi e, mais recentemente, o “Estúdio Educativa”, com Paulo Agostinis e José Barba, ambos recebem artistas da cidade[11]. Destaca-se ainda a sua programação especial como no aniversário de Campinas, quando se toca somente músicas de campineiros ou identificadas com a cidade; segundo a coordenadora artística Ivete Cardoso, são mais de 300 artistas se revezando na programação[12].

Sobre a programação musical da Rádio Educativa, Roldão faz a seguinte afirmação:

A programação musical da Educativa não é elitista e ao mesmo tempo não reproduz a massificação cultural, verificada na maioria dos meios de comunicação que apresentam apenas a produção artística, imposta pelas grandes gravadoras. A programação musical também se torna educativa ao desenvolver conteúdos a partir da música, e resgatar a cultura local através de grupos e músicos da cidade (2006, p. 6).

Para J. Carlos Barba*, coordenador da emissora Educativa, “toda música tem um nexo”, e se faz necessário entender a coerência e o contexto de uma obra musical, suas influências e implicações. Ao ouvinte, afirma Barba*, deveria ser dada a possibilidade de escolha e conhecimento de um repertório diversificado, o que favoreceria a formação de um gosto próprio e não introjetado.

Observa-se aqui, uma crítica à produção artística tornada apenas manufatura, orientada por segmentos de mercado. Nesse caso um conjunto de conteúdos previsíveis difundidos relacionam-se a certas espessuras técnicas-informacionais-normativas, condição e resultado de ações que conferem obediência e rigidez ao cotidiano: “As pessoas não experimentam suas crenças estéticas como meramente arbitrárias e convencionais; sentem que elas são naturais, adequadas e morais” (Becker, 1977, p. 218).

Harvey (1980), por sua vez, lembra-nos que os “signos, símbolos e sinais” fortemente presentes no meio ambiente urbano são grandes influências, sobretudo entre os jovens:

Moldamos nossa sensibilidade, extraímos nosso sentido de desejos e    necessidades, e localizamos nossas aspirações e respeito de um ambiente geográfico que é em grande parte criado. É provável que nossa cultura, concebida como um domínio étnico, emane do espaço criado mais do que tem êxito em criar espaço. A alienação, frequentemente manifesta da cultura e uma repulsa à imagem da cidade, em parte decorre de um profundo alheamento (Harvey, 1980, p. 268).

A partir de ações de formatação e perda de referência o gosto musical, em especial dos jovens, simplesmente por desconhecimento, se torna o mesmo.

O sistema aberto na produção fonográfica: a drenagem do saber dos lugares

Sob o imperativo da padronização musical e da concentração de mercado[13] forma-se o chamado sistema aberto na produção fonográfica (Morelli, 1988; Dias, 2000; Beuscart, 2008; Chaney, 2010). Muller (2005) explícita o funcionamento desse sistema de reorganização da empresa do disco, destacando a maneira como a chamada “produção independente” e os pequenos selos (gravadoras de menor porte) se inserem nos circuitos superiores da economia, incorporados pelas majors, as grandes empresas fonográficas:

…um processo de terceirização da produção, onde os trabalhos das ‘indies’ e de artistas independentes são incorporados pelas ‘majors’ onde as primeiras produzem discos voltados para segmentos de mercado bem definidos, caso seus produtos se mostrem promissores, as grandes firmas se apropriam deles através do estabelecimento de contratos de licenciamento, de distribuição, de compra do repertório, do catálogo ou mesmo do selo inteiro (Muller, 2005, p. 39).

Entre as mudanças no circuito sonoro, Vicente (1996, 2001) adverte que as novas tecnologias inseridas na empresa fonográfica provocaram a pulverização da produção e a redução radical dos custos, ocorrendo o incentivo a selos independentes e ao mesmo tempo favorecendo o sistema aberto. A rápida obsolescência dos equipamentos – ao gerar mais dificuldades para manutenção de estúdios grandes – tende a determinar a saída das majors dessa área de atividades, que passa a ser ocupada por estúdios de menor porte[14]. Logo:

mesmo possibilitando o surgimento de selos independentes e tornando a produção musical mais acessível – o advento das novas tecnologias não representa, necessariamente, um momento de ruptura com o processo de concentração oligopolista da indústria fonográfica podendo se tornar, na verdade, um poderoso elemento para sua manutenção (Vicente, 1996, p. 77).

Com o monopólio dos meios de informação de massa e por meio da própria estrutura do circuito de produção fonográfico o capital humano dos lugares é drenado, inferindo doses de informação ao saber que o constitui. Difunde-se desse modo a melhor mercadoria, a mais objetiva, própria ao consumo.

A seguir apresentamos o inventário dos selos (gravadoras de pequeno porte) em atuação na Região de Campinas entre os anos de 2005 e 2009. Enfatizamos as relações desses prestadores de serviços fonográficos, responsáveis pela produção musical local, com os circuitos superiores da economia[15]: empresas de informação, corporações, distribuidoras de fonogramas, entre outros.

Inventário dos selos na Região de Campinas: produção fonográfica e círculos de cooperação no território

O próprio trabalho dos selos na maioria dos casos já os coloca na condição de conexão com os grandes canais de distribuição e divulgação da produção fonográfica. Inventariamos o funcionamento de dez selos na região de Campinas (Quadro 1). Estabelecendo contatos a partir de seus escritórios, os selos oferecem serviços de assessoria fonográfica, pré-masterização, arte final, editoração musical, entre outros.

SELOS DA REGIÃO DE CAMPINAS – ESPESSURA DO CIRCUITO (2005-2009)
Caracterização do selo Fluxos e círculos de cooperação – repercussão espacial das atividades fonográficas
Nome Gênero/segmento musical Fixo acionado Proprietário Distribuidora
Empresa responsável
Comércio, produção, difusão no rádio e eventos musicais
FÁBRICA Multi-gênero Estúdio e escritório (Taquaral, Campinas) Gustavo Souza (publicitário) Tratore – CDs vendidos em lojas de redes nacionais e lojas locais.
– Venda digital pelo I-Tunes
– Trabalhos realizados a partir de leis de incentivo (lei Rouanet) e pelo FICC (Fundo de Incentivo à Cultura de Campinas).
– Realiza “pocket shows”
– Predominância de artistas locais
– Divulgação na Rádio Educativa e Cultura (Amparo)
KALAMATA Moda de viola.
(Ten String Guitar)
Erudito
Escritório (Cambuí, Campinas) Antoine Kolokhatis (músico) Sonopress – CDs vendidos em lojas de redes nacionais e lojas locais
– Venda digital pela AIODA
– Trabalhos realizados a partir de leis de incentivo (lei Rouanet) e pelo FICC.(Fundo de Incentivo à Cultura de Campinas).
– Predominância de artistas locais
– Divulgação na Rádio Educativa e Cultura (Amparo)
MONDO 77 Rock Casa de show até 2005
(Barão Geraldo, Campinas)
Gustavo Furniel (empresário) Tratore – CDs vendidos em lojas de redes nacionais e lojas locais.
– Venda digital
– Artistas de diversos lugares como The Violentures (Campinas), Banzé (São Paulo) e Walverdes (Porto Alegre).
– Show de lançamento com vjs da MTV (Grupo Abril)
CÂNTAROS Música instrumental Escritório (Campinas) Antônio Dias (músico) Sem informação – Trabalho em cooperativa com custo médio de R$8 mil por disco.
– Predominância de artistas locais
NASCENTE Escritório (Barão Geraldo, Campinas) Sem informação
NADY CALVI Popular (sertanejo, entre outros) Estúdio e escritório (Valinhos) Nadir Calvi (músico) Eldorado – Suporte físico vendido em lojas locais.
–  Predominância de artistas da Região
– Divulgação em rádios não concessionadas e rádios AM, dentre elas a Rádio Central.
DIVULGASOM Popular (sertanejo, entre outros) Estúdio e escritório (Vila Industrial, Campinas) Maurício Macarrão (músico) Sem informação
GENES Popular (sertanejo, entre outros) Estúdio e escritório (Jardim São José, Campinas) Crysogenes Cebolinha (músico) -Artistas de fora de Campinas.
NÓIS NA FITA Rap Escritório (Jundiaí) Nuno Mendes (locutor de rádio) Sky Blue – Artistas da região de Campinas.
– Produção em estúdios caseiros
– Divulgação em rádios não concessionadas
– Divulgação pela rádio 105 FM
FACES DA MORTE Rap Escritório (Hortolândia) Erlei Aliado G (músico)

Fonte: autoria própria

A relação entre os selos e as majors nos remete a uma divisão mais profunda das tarefas no território e nos indica também a posição do “mestre de cerimônia das paradas de sucesso” para as gravadoras, as quais entregam os “produtos” direto às emissoras. Como resultado, a produção em si – materialização do registro sonoro – conhece uma precoce e estrutural padronização. Os casos de algumas gravadoras da região ilustram as afirmações.

A exemplo dos estúdios fonográficos, a atuação dos selos envolve uma série de trabalhos eventuais acionados seja para serviços de liberação de direitos, promoção de eventos, entre outros. Este é o caso, por exemplo, da consultoria jurídica para artistas apenas negociada pelos selos e executada por terceiros. Antoine Kolokhatis, gerente do selo Kalamata*, explica que se trata de uma operação onerosa e por vezes se gasta até 30 mil reais em direitos autorais antes mesmo de gravar um CD.  A articulação do selo envolve agentes diversos desde as lojas de discos até distribuidores como a empresa Sonopress.

Uma ou duas pessoas desenvolvem o trabalho de cada um dos selos de forma direta. Estes tipos de prestadores de serviços fonográficos organizam ainda eventos para divulgar o seu cast. O selo Fábrica opta por realizar pocket shows (pequenas apresentações musicais) em shopping centers, livrarias ou até mesmo em lugares públicos, como o Largo do Rosário no centro de Campinas. São apresentações que reúnem os artistas dos selos e ocorrem sem periodicidade definida, seja para o lançamento de um disco, ou participação em congressos, entre outros. Por outro outro lado, o Grupo Mondo 77 organizou um show de lançamento do selo no ano de 2005 em São Paulo, com a participação de VJs da MTV (Music Television), emissora de TV ligada ao Grupo Abril.

A Nady Calvi, selo-gravadora, sediada em Valinhos, cuida “da veiculação do trabalho em programas de rádio e TV até a criação de letras de músicas”. Os serviços incluem a produção e a direção do show, por preços que variam de R$10 mil, incluídas aí apenas inserções no rádio, até R$ 40 mil, com aparição na TV e “o acréscimo de instrumentos eruditos e backing vocals, além de uma cuidadosa produção gráfica da capa e das fotos”. Todos os trabalhos são masterizados em São Paulo e saem em parceria com a gravadora Eldorado, “o que pode virar sucesso vai para São Paulo”, afirma seu produtor Nady Calvi[16].

A situação não é muito diferente para a gravadora especializada em sertanejo Divulgasom, a qual funciona desde 1984 em Campinas. Com um CD custando em média 20 mil reais a gravação é feita com a ajuda de um teclado; este aparelho faz o som dos violinos e de uma bateria eletrônica.

A venda de música digital que hoje representa parcela significativa do mercado fonográfico é preponderante na ação de dois selos: o Fábrica e o Kalamata. De acordo com dados da ABPD (Associação Brasileira dos Produtores de Discos), foram baixadas no mundo 420 milhões de faixas singles durante 2006. A música digital representa 6% da receita das gravadoras e a música disponível em celular responde por 40% da receita digital das companhias do setor fonográfico. A IFPI (International Federation of the Fonographic Industry) afirma que a perda das gravadoras com downloads ilegais chega a 2 bilhões de dólares no mundo. Segundo a entidade, 52% do volume comercializado no Brasil em 2003 eram de suportes ilegais, esse número vem aumentando, o que faz do país um dos “prioritários no combate à pirataria”.

Gustavo Souza, proprietário do Selo Fábrica em operação desde 2002, explica que a produção genérica não afeta o selo que distribui os CDs por meio da loja virtual I-tunes[17]. Quase todo o catálogo é composto de artistas da cidade, grande parte de músicos formados na Universidade Estadual de Campinas. Entre os artistas destacam-se Estado Maior, Marcelo Onofri, Tatiana Rocha, Companhia Sarau, Angu, entre outros.

O selo Kalamata distribui seu material via digital para os sítios de venda de música na internet, pela empresa estadunidense AIODA (Aliança Internacional de Distribuição On-Line). Entre os gêneros gravados destaca-se a música erudita, porém o foco é no potencial da moda de viola para se projetar no exterior, com a comercialização do Brazil Ten string guitar, tocado por músicos em sua maioria locais ou da região. Os Suportes físicos do Kalamata são vendidos nacionalmente nas Redes FNAC e Saraiva (discos, livros e afins) e nas lojas Pulsar, Iluminações, e até 2006 na Loja Coreto Musical, estas últimas, lojas de disco locais. Criado em 2005, o selo Kalamata é parte da prestadora de serviços Direção Cultura que produz eventos para clientes do circuito superior de Campinas e região, como o Clube Hípica, Shopping Center Iguatemi, Espaço Cultural CPFL, entre outros. A empresa presta assessoria em marketing cultural e cuida do “Desenvolvimento de projetos culturais adequados às necessidades das empresas”, o que inclui a “orientação sobre utilização da Lei Federal de Incentivo à Cultura” (Lei Rouanet).

Ambos os Selos gravam em estúdios de maior porte. O Fábrica produz no seu próprio estúdio, enquanto o Kalamata utiliza os estúdios Mais Mais e Síncopa, este último onde foi gravado o disco do grupo Sax Bem Temperado.

Os selos Fábrica e Kalamata, ainda de modo semelhante, não divulgam seus trabalhos em rádios não concessionadas. No circuito FM seus trabalhos fazem parte da programação da Rádio Educativa, a qual por lei deve manter em sua programação 15 % de espaço “para divulgação e apresentação de artista oriundos ou residentes na cidade de Campinas” (Lei Nº. 12.346, de 1º de setembro de 2005) e da Rádio Cultura de Amparo. Estes selos trabalham com parte da receita proveniente de leis de incentivo à cultura, como Lei Rouanet e outros fundos culturais, a exemplo do Fundo de Cultura Municipal de Campinas, o FICC[18].

Em seus repertórios constam títulos como “Prêmio Syngenta Instrumental de Viola” do Kalamata. Referência à empresa do agronegócio, patrocinadora do projeto, de acordo com o trecho do encarte do CD, “comprometida com a agricultura sustentável, com a saúde e a qualidade de vida da população”, em uma espécie de “mecenato das corporações”.

De maneira diversa dos selos anteriores, o trabalho do Genes é basicamente com artistas de fora de Campinas; “Aqui na cidade para mim não interessa”, afirma o seu produtor Cebolinha*, que grava grupos de gêneros popularescos de Porto Alegre, Cuiabá, entre outros lugares. Cebolinha nos fala* da pouca aceitação da produção do selo entre os meios de massa: “Mandar pra rádio a gente manda, mas daí até tocar é outra história. Escolhemos a música de trabalho e mandamos pela internet ou então com o Natanael, nosso divulgador. Ele vai rádio por rádio. Porém hoje mandamos os trabalhos mais pela internet. Mandamos para a rádio Central AM, uma única exceção… enfim, a gente manda pra todas as outras rádios, mas elas não tocam. Se não pagar elas não tocam”.

Por fim, os selos Nóis na Fita e Faces da Morte, ligados ao rap, também se direcionam ao segmento popular e contam com artistas de diversas cidades da Região de Campinas a qual abriga cerca de 300 grupos do gênero musical da cultura hip hop (Alves, 2005, 2012, 2013, 2014). As suas vendas se realizam em outros canais, com menor presença da venda via digital, preponderando relações de proximidade na venda de sua produção, sobretudo entre amigos, via postal, nos shows, lojas locais, entre outros. Entretanto ambos divulgam trabalhos na emissora concessionada 105 FM mediante o pagamento de “jabá”, o que não exclui a distribuição do fonograma em rádios livres.

Considerações finais

Apresentamos nesse texto dois momentos do circuito musical campineiro tendo como fio condutor a produção fonográfica local. A questão que nos inquieta é: a despeito do sistema aberto – recusando-o – quais as possibilidades de revanche da produção musical horizontal nas cidades?  Se é que estas chances existem mediante a força contemporânea de atuação da empresa fonográfica mundial.

Na concentração no setor fonográfico, característica do sistema aberto, tem-se um exemplo do extremo controle da informação. Há aí um verdadeiro nó atando o potencial criativo da cultura popular pelo mundo afora.  As conexões de parte das gravadoras da Região de Campinas parecem apontar nesse sentido.

Entendemos que tal orientação traz luz à docilidade para com os estatutos, que consciente ou inconscientemente orienta todo o processo de criação. De violência contra o instituído, a cultura popular e as manifestações de vanguarda, tendem a se dissipar, orientadas para o apaziguamento e a manutenção: o passado recorrente ou a presentificação.

Nossa empiria demonstrou que Campinas abriga, grosso modo, desde meados da década de 1980 um circuito musical alternativo aos grandes meios de informação, movimentado por trabalhadores culturais atuantes em diversos lugares da cidade, sejam eles produtores fonográficos, articuladores, radialistas, entre outros.

Dentre os trabalhadores culturais destacamos os apreciadores sonoros, isto é, aqueles que aplicam seu capital-conhecimento e dinamizam seu campo de informação em virtude primeiramente da música. Este grupo teria em comum o gosto pelo som. Entre os apreciadores de música, estão, portanto, aqueles que entendem o “alternativo” como o trabalho de quem persiste no caminho do gosto, postura residual em relação aos padrões impostos pelos circuitos superiores atrelados à produção fonográfica.

Em torno do saber sonoro, o capital-conhecimento fundado na experiência dos sujeitos, favorece a ascensão de círculos de cooperação no circuito sonoro, definitivamente marcados pelo diverso, responsáveis pela articulação da produção musical nos lugares. Como derradeira implicação do circuito sonoro, acontece o trabalho coletivo em torno da música, que envolve diferentes e complexos elementos da cidade.

Visto como fruto de certa teimosia poder-se-ia dizer do som resultante daí, não ser um produto que se quer fazer, mas uma construção inevitável que deve ser realizada por não se conseguir escapar. O importante para os lugares é o circuito sonoro se constituir dirigido, cada vez mais, pelos próprios agentes das cenas. Que os sons diversificados se avolumem e o questionamento intransigente sobre a partilha dos meios de informação se espraie.


 

* Cristiano Nunes Alves é professor adjunto na Universidade Estadual do Maranhão (DHG CECEN / UEMA); pós-doutor em Geografia pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP); mestre em Geografia (2008), graduado em Bacharelado (2005) e em licenciatura (2006) em Geografia pela Unicamp. Desenvolve pesquisas em Geografia Urbana e Epistemologia da Geografia, atuando principalmente nos seguintes temas: circuitos e cenas culturais, economia urbana, informação, comunicação, metropolização, cartografia alternativa, cultura popular e música.

 

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Notas

[1] Raffestin (1993) denomina regiões-chave, as áreas que devido aos seus recursos diversos, possibilitam a otimização do poder a partir de um aumento de competitividade com, por exemplo, maior produtividade ou tecnologias de informação acrescidas ao território. Caracterizada pela desigualdade socioterritorial a cidade de Campinas é núcleo da Região Metropolitana de Campinas (RMC), composta por 19 municípios, e atualmente com 2.866.453 habitantes (Estimativa – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, 2012). Nesse sentido Cano & Brandão (2002, p. 124) afirmam que a evolução da mancha urbana campineira “sempre esteve articulada a interesses da elite local” com a legislação urbanística, os mecanismos de especulação e orçamentos públicos comprometidos com grandes empresas, levando à formação de um espaço urbano fragmentado e segregado. Em Campinas ao mesmo tempo em que se aceleram, em especial nos últimos vinte anos, os processos de periferização e favelização, localizam-se consideráveis densidades técnicas e informacionais decorrentes de setores estratégicos da economia. Trata-se de um importante elo informacional, polo industrial e tecnológico intensamente ligado à metrópole paulistana.

[2] Partimos da ideia de que a existência e a dinâmica de um circuito ganham significado quando analisadas as estratégias políticas no território usado, nossa categoria de análise, sinônimo de concretude e acontecer de sistemas de objetos e sistemas de ações no espaço geográfico, apontando para situações específicas. Para Santos (2004, p. 232). “A utilização do território pelo povo cria o espaço” e o território “se chama espaço logo que encarado segundo a sucessão histórica de situações de ocupação efetiva por um povo – inclusive a situação atual – como resultado da ação de um povo, do trabalho de um povo.” O movimento do circuito sonoro implica no encontro e na fusão de ações, bem como no fluxo de informações atreladas; as materialidades, com o uso dos fixos: bares com som ao vivo, lojas de disco, lojas de tecnologia de gravação, emissoras de rádio e ainda o uso dos mais diversos objetos técnicos – de aparelhos de rádio até telefones celulares. Sua dinâmica abrange o registro da produção fonográfica, as mediações das experiências musicais cotidianas; perpassa a produção e os eventos musicais bem como todo o conflito e cooperação entre os agentes envolvidos.

[3] Lucca (2002, p. 115) assevera que à possibilidade infinita de criação musical contrapõe-se o fato de que: “os elementos musicais estão sendo tratados ou manipulados na maior parte das músicas transmitidas atualmente pela mídia, por uma notável simplicidade, limitação e repetição, constantemente crescentes desde sua atuação em nosso país, mais precisamente desde a década de 60.” A autora supracitada, em um exame detalhado da programação do circuito de rádio FM paulistano no ano de 2001 atestou a extrema padronização do conteúdo musical difundido. Entre os índices apresentados por Lucca (2002), destacam-se: 40% das músicas do rádio FM têm a duração de 3’30 a 3’59; 60% da programação é de música estadunidense; 60% da programação é da década de 1990 e 20% da década de 1980.

[4] Debord (1967) afirma que a “Sociedade do Espetáculo” sinaliza para um estado de coisas no qual “é a forma que escolhe seu próprio conteúdo técnico” (p. 20), uma ampla instrumentação cara ao controle da humanidade e dos seus lazeres por parte de uma “economia burocrática”, que implica não deixar “nenhuma margem significativa de escolha (…) para a massa explorada” (p. 43). Sobre a cidade tida como “o espaço da história”, lugar de concentração do poder social e da “consciência do passado” (p. 116), recai o intento espetacular de supressão da distância recolhendo-a para si como separação: “A mesma modernização que retirou da viagem o tempo, lhe retirou também a realidade do espaço” (p. 112)

[5] Falamos das emissoras autorizadas pelo Estado, integrantes do sistema de concessões conforme o Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei 4.117 de novembro de 1962).

[6] Entre os bares campineiros, onde grosso modo predomina o repertório médio, temos: Tarantino (Cambuí), Bar Doce (Barão Geraldo), Dona Lina (Cambuí), Água Doce (Cambuí), Quintal Brasileiro (Cambuí), Bar Pessoa (Nova Califórnia), Tradicional (Sousas), Dom Quixote (Cambuí), Rota 42 (Cambuí), Dona Bella (Bosque), Farol da Barra (Chácara da Barra), Bem Bom (Guanabara), Alcool Íris (Cambuí), Café 7 (Castelo), Campinas Hall (Mansões Santo Antônio), Gold Street (Santa Genebra), Alles Bier (Sousas), São Joaquim (Cambuí), Paparazzi (Cambuí), Na Lata (Cambuí), Camaleão (Chácara da Barra), Barril da Máfia (Guanabara), Tom Grill (Cambuí), Loft (Cambuí), Senhor Barão (Barão Geraldo), Estação Santa Fé (Barão Geraldo), Oca Brasil (Barão Geraldo) e Rudá (Barão Geraldo) e The Red Lion (Cambuí).

[7] Organizado pela Chop Suey Discos, o Festival Auto Rock vem ganhando força e no ano de 2013 inclui apresentações em diversas áreas de Campinas, inclusive em sua periferia, caso de evento musical realizado na Praça Integração, no Bairro Padre Anchieta na divisa com os municípios de Sumaré e Hortolândia.

[8] Jornal Correio Popular. 4 de janeiro de 2002

[9] Jornal Correio Popular. 10 de abril de 2002.

[10] Lei municipal N° 12.346, de 1° de setembro de 2005. Determina ao Poder Executivo, através da Secretaria de Cultura, Esportes e Lazer, destinar no mínimo 15% (quinze por cento) da Programação Musical Diária da “Rádio Educativa FM 101, 9”, Espaço para Divulgação e Apresentação de Músicas De Artistas, Oriundos ou Residentes na Cidade de Campinas.

[11]  Entre os artistas mais antigos figuram: Geraldo Lamana, Orquestra 770, Sexto Sentido, Celly Campello, Marcelo Costa, Cláudia Moreno, Paulinho Nogueira, o irmão Celso Mendes, Laércio de Freitas e Lumumba. Entre os mais recentes destacam-se o Grupo Soma, Jorginho Matheus, Ricardo Matsuda e Hot Jazz Club.

[12] Jornal Correio Popular. 19 de junho de 2005.

[13]  Dá-nos ideia da ferocidade da concentração no mercado fonográfico mundial o fato de que na década de 1980 havia seis empresas controlando aproximadamente 70% da produção mundial, enquanto hoje a posse de 80% de toda a música veiculada no mundo cabe a quatro empresas, a saber: Universal, Warner-EMI, BMG e Sony, as grandes gravadoras chamadas de majors. Dados da IFPI (International Federation of the Phonographic Industry) de 1997, afirmam que o lucro com a venda de 107, 9 milhões de unidades no mercado fonográfico mundial foi de U$ 1, 275 bilhões (In Vicente, 2001). O Brasil figura como o sexto maior mercado fonográfico do mundo, composto por cerca de 70% de repertório nacional. Em 2004 a indústria do disco teria movimentado no país cerca de R$ 600 milhões apenas com a venda dos registros sonoros (CDs e DVDs, em especial), dos quais 77% é repertório nacional (Fonte: Crowley Broadcast Analysis).

[14] Vicente (2001) apresenta comparações entre a operação das majors e das indies (as pequenas gravadoras). O autor supracitado lembra que as majors operam sob divulgação global e maciça, valendo-se da sinergia de diferentes formatos de mídias e utilização de inovações tecnológicas, alavancando suas vendas por meio do lançamento dos amplos catálogos musicais que possuem. As indies, por outro lado, realizam frequentemente todas as etapas da produção, prospectando novos mercados, formando e distribuindo artistas. Elas tendem a associar-se às majors para ampliar o seu mercado. Tais empresas exploram os mercados locais e segmentos específicos, produzindo e divulgando em condições limitadas um amplo número de artistas. Não possuem catálogos expressivos e dependem decisivamente das vendas de seus artistas.

[15] De acordo com Santos (1979), circuitos superiores e inferiores da economia se movimentam conjuntamente nas cidades dos países pobres, ambos resultantes da incompleta modernização tecnológica. O circuito superior é a repercussão espacial decorrente do progresso tecnológico, fruto da ação dos beneficiados com esse processo. Por outro lado, o circuito inferior é um resultado indireto do mesmo progresso, que compreende material e organização residuais, numa íntima relação com a pobreza urbana, seja na procura de dinheiro líquido, na sua originalidade ou nas técnicas arcaicas empregadas.

[16] Jornal Correio Popular de 18 de outubro de 1996

[17] Informações em www.ifpi.org.br

[18] Criado pela Lei N° 12.355 de 10 de setembro de 2005, o FICC é constituído pelo Secretário Municipal de Cultura, um representante do Conselho municipal de Cultura, um da Secretaria Municipal de finanças e dois servidores indicados pela Secretaria Municipal de Cultura, Esportes e Lazer. O critério para conseguir aprovação de um trabalho é ser morador de Campinas e não trabalhar como servidor municipal. A verba anual para o projeto é de 790.000 (setecentas e noventa mil, UFICs o que corresponde a aproximadamente 1 milhão e quatrocentos mil reais). Dentre os objetivos, o fundo de cultura visa “promover o intercâmbio e a circulação de bens e atividades culturais com outros municípios, estados e países, destacando a produção campineira” (Artigo 2°. VII parágrafo).

 

Recebido em: 10 de julho de 2017

Aprovado em: 17 de outubro de 2017