Ano XVIII 01
editorial
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AS MÁS-LÍNGUAS

Luiz Norões | Aquarela, sem título, s/d
Luiz Norões | Aquarela, sem título, s/d

Assistimos no presente a enfrentamentos discursivos em que usos canônicos, privilegiados ou desviantes da(s) língua(s) competem pelo direito de nomear e narrar na ciência, na política, nas artes, nos processos múltiplos de identificação dos sujeitos contemporâneos, nas redes sociais e no resquício do que talvez ainda possamos chamar de esfera pública. O presente dossiê da Revista Z Cultural, nº 1 de 2023, se propõe como espaço de discussão sobre esses enfrentamentos a partir de campos variados, abrangendo de estudos de linguística, como o importante artigo de Dante Lucchesi sobre as raízes históricas do racismo linguístico no Brasil, a reflexões participativas, como o artigo de Dieison Marconi, um trabalho de observação situada do uso de alguns conceitos pela militância nas redes sociais.

A questão racial também aparece no artigo de Gabriel Chagas sobre a relação entre Langston Hughes e Nicolas Guillén e no relato de uma experiência de letramento racial por Guilherme dos S. Ferreira da Silva e Jade Soares do Nascimento, assim como na entrevista-ensaio visual do artista plástico Sérgio Adriano H, em que a língua é extrapolada para a imagem e se torna uma corporificação da ideia de “tomar a palavra”, como explicam Dalva França de Assis e Silvana Barbosa Macedo. Os feminismos e questões de gênero, centrais nas discussões sobre linguagem, são tratados nos artigos de Drica Madeira e Adriana Azevedo, e os limites da linguagem aparecem no ensaio de Louise Furtado de Souza sobre livros de Marília Floôr Kosby e Ieda Magri. Eduardo Schaan, por sua vez, discute como, na peça Tybyra, o artista potiguara Juão Nyn propõe a escrita em Potygyês, mistura do Tupi-Guarani com a língua portuguesa que ressignifica a língua do colonizador. Por fim, a relevância de análises do discurso e da narrativa como ferramentas para qualificar a discussão sobre “disputa narrativa” é contemplada pelos textos de Fábio Fernando Lima e de Barbara Venosa.

Além do dossiê, como é tradição da revista, publicamos artigos que abordam questões contemporâneas, como o relatório de Luiz Eduardo Soares escrito a partir de uma pesquisa com moradores da Maré sobre a exposição à violência armada; e o ensaio de Maria Caterina Pincherle e o de Lucas Bandeira, que recuperam a discussão recente sobre o centenário do Modernismo de 1922. Outro aspecto da cultura contemporânea, a tendência da literatura contemporânea de “colar-se à vida e à experiência das mulheres”, aparece no artigo de Luciana Conti sobre o romance Pagu no metrô, de Adriana Armony. Publicamos ainda três poemas de Vera Lins, acompanhados de fotos feitas pela escritora, e uma resenha de Beatriz Resende sobre Paixão simples, de Annie Ernaux. Na seção Vale a Pena Ler de Novo, uma rara entrevista de Guimarães Rosa é recuperada pela acadêmica Heloisa Teixeira, como agora assina Heloisa Buarque de Hollanda. Fechando este número, o poeta, romancista e pesquisador Edimilson de Almeida Pereira discute as múltiplas formas da linguagem poética a partir de sua obra literária e ensaística.

Revista Z Cultural